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Bom dia, Ano Novo!

Meu mantra

Nas várias religiões que cobrem o mundo há discussões infindas sobre o valor das orações repetidas. Fosse eu sacerdote (ou ainda melhor, um bispo) de uma delas, defenderia a repetição como a reiteração do desejo não alcançado, a insistência, a persistência, a reprodução e a multiplicação da vontade. “Ah, mas Mateus ensinou que não devemos multiplicar as palavras, como fazem os pagãos, que usam a força das palavras para serem ouvidos.” Segundo o apóstolo cristão, Deus sabe o que necessitamos, antes mesmo que peçamos a ele. Porém, prevenindo-se contra as dúvidas, ele ensinou a seus discípulos a rezar o Pai Nosso, tantas vezes repetido ao longo de todos os dias.

Mas entre nós, míseros mortais, a força da palavra deve ser usada à exaustão, já que os ouvidos dos poderosos são moucos, mesmo quando sabem, também à exaustão, o que necessitamos.

A oração, para mim, é um ato íntimo (como pregava Mateus), uma busca pelas forças recônditas de nosso próprio ser. Não é prova de abandono, mas de apego à vida, até em momentos em que a esperança é ínfima. Sobretudo, a oração utiliza a energia da palavra para também multiplicá-la em nosso interior. Desse modo, não é preciso ser religioso, no sentido de pertencer a uma determinada organização mística, para fazer uma oração. Noel Rosa fez uma canção em louvor a uma mulher amada e lhe deu um nome adequado: “Feitio de Oração”. E era (é) realmente uma oração, sem necessariamente ser dirigida a um ser supremo. Os pintores também rezam quando produzem seus quadros, porque retiram de dentro de si a energia da criação. Os poetas literalmente oram e predicam em seus poemas, construídos com a força da palavra.

Os budistas e outros religiosos orientais vão além das palavras para proferir suas orações, sempre em busca de um caminho energético. Fixam-se, em seus mantras, nos sons de palavras antigas, algumas incompreensíveis, cuja repetição e, possivelmente, a vibração ou onda sonora com que são produzidos criam vários efeitos sobre a pessoa que as emite ou, como creem os seus adeptos, entre o emissor e aquelas que são alcançadas por tais sons.

Repetir um mantra abre portais para o akasha, que seria, no nosso limitado entendimento ocidental, uma espécie de substrato espiritual, o cosmos, a quintessência universal.

Por isso, retomo um recado ao ano de 2010, publicado em dezembro de 2029 no Banco da Poesia, e dedico-o ao novo ano que abre agora suas portas. A releitura serviu para convencer-me que pouco mudou, nos limites da pátria amada, nem em 2010, nem em 2011. Os poucos avanços que conquistamos foram quase todos inerciais, produtos da energia social que não necessita de apoios oficiais para mover-se, ou de empurrões do mundo globalizado, que nos obriga a acompanhar ou copiar ações de outros países. Continuamos a ser meros exportadores de produtos primários (ou de commodities, como dizem os mais sofisticados) e de alguns semimanufaturados, sem agregar valor às nossas riquezas naturais. Temos pouco desenvolvimento tecnológico, porque nos faltam Educação e pesquisa científica. Recebemos afagos da vaidade quando anunciam que nos tornamos a oitava economia mundial e logo seremos a sétima, passando pelo Reino Unido e pela França, o que só nos distrai de outra verdade mais contundente: o Brasil ainda está na 84ª posição no índice de Desenvolvimento Humano, atrás de muitos países da América Latina, como Argentina, Chile, México, Uruguai, Cuba, Costa Rica, Panamá, Peru, Equador  e Venezuela. A cada novo governo, a cada novo ano, ecoam as promessas mântricas de prioridade para a Educação, combate à fome e à miséria (como se fossem coisas separadas), faxina para os malfeitos (mas nunca para todos os malfeitores). Continuam a ser mantras sem reverberações.

Eis-nos, pois, nascente ano de 2012, novamente embasbacados diante de ti, um novo ano aventuroso, cujas venturas podem se confundir apenas com leves ventos de esperanças. Arrepiados, por exemplo, quando se anuncia, já para janeiro, a troca do roto pelo esfarrapado na pasta da Educação, que deveria ser o ministério mais importante para qualquer governo. Temerosos, novamente, quando ainda perduram as estruturas políticas viciadas e os estratagemas indecentes para manter o poder de determinados partidos. Assombrados porque, diante de um novo ano eleitoral, quando iremos escolher novos prefeitos e vereadores, nada mais existe, em matéria política, que a mera vontade de se ganhar eleições, sob qualquer condição, com qualquer indivíduo, seja ele preparado para o trabalho público ou um virtual aproveitador do dinheiro público.

É hora, portanto, de repetir meu mantra, certo de que, em um ano qualquer mais radiante, conseguiremos fazer com que nossa sociedade nacional cresça e apareça –  mais séria, mais respeitosa e respeitada.

E não custa também repetir, apesar disto ser um velho clichê: Feliz Ano Novo para todos! (Cleto de Assis)

 Oração a 2012

2012,  que estás a chegar
tão cheio de esperanças, tal como teus irmãos passados,
venha até nós com certezas e realizações.
Faze-nos atingir o caminho da Justiça, em todas as suas direções
e realiza o milagre da multiplicação dos pães
sem o auxílio mesquinho de astuciosas dádivas politicóides,
mas alcançado por meio do Trabalho digno e recompensador.
Faze com que a Saúde seja também imperadora em todos os lares
e afasta principalmente as crianças das caliginosas névoas da tristeza
e da fome e da doença.
Acende a chama pentecostal do conhecimento
sobre todas as cabeças, por meio da nobreza da Educação e da alegria do Saber.
Livra-nos das promessas vazias dos homens e das mulheres que querem nos liderar
e encaminha-os ao cometimento de ações sérias e consequentes
com total respeito ao imposto nosso de cada dia.
Não os deixes cair nas tentações das propinas
e não lhes perdoes as suas ofensas, nem lhes dês a benção espúria da impunidade.
Unge-nos com o bálsamo da paciência
para que possamos suportar as falsidades, as descaradas mentiras,
os impropérios gramaticais dos horários eleitorais
e as ladainhas sem sentido dos salvadores da Pátria.

Amigo 2012, tu que vens com data certa para um novo exercício de Democracia,
faze com que ela permaneça entre nós,
senhora que é da Liberdade e da Justiça Social.
Ajuda-a a não ser usada para a prosperidade dos demagogos
ou para o gozo dos déspotas.
Mostra aos pretensos donos do poder que só ela salva
e pode nos garantir o direito de opinião e de expressão
sem termos que nos submeter à censura dos donos das verdades
ou ao estulto absolutismo de um único partido.
No período eleitoral, faze que, quando houver ódio,
possamos também falar de amor sem nos envergonharmos;
quando houver ofensa, que ela seja sucedida pela pacificação;
quando houver discórdia, que possamos remar a favor da união;
quando houver dúvida, que tenhamos de pronto o esclarecimento;
quando houver erro, que possamos chegar rápido à verdade;
quando houver desespero, ajuda-nos a manter a esperança;
quando houver tristeza, que se eleve a alegria;
quando houver trevas, que se faça a luz.

Sobretudo, aguardado 2012,
faze com que finalmente compreendamos o valor da Paz e do Trabalho
para que não precisemos mais suplicar por felizes novos anos .

Cleto de Assis – dezembro de 2009, renovado em dezembro de 2011.

Novo depositante: Tonicato Miranda

Conheci Tonicato Miranda há pouco tempo. Já havia lido trabalhos seus no blog de João Bosco Vidal, Palavras, Todas Palavras e, recentemente, protagonizamos uma rápida polêmica com o poeta Roberto Prado, motivada por um desencontro de opiniões após a morte de Wilson Martins. Tudo resolvido, as palavras voltaram a seu equilibrado lugar e a energia das faíscas virou versos, como se pode constatar abaixo. Tonicato ainda não havia feito depósitos no Banco da Poesia e, após insistência nossa, mandou um poema, com dedicatória ao gerente desta instituição bancária, sem, evidentemente, qualquer merecimento. Pedi também fotos e currículo e ele enviou o que se segue.

“Sobre meu currículo, teria de perguntar do que. Isto porque não tento repetir Pessoa, mas tenho várias facetas. E quem não as tem?
O técnico transporteiro, envolvido com questões de transporte e da mobilidade urbana, e isto não cabe aqui numa biografia cultural.
Tem ainda o técnico de planejamento e projetos cicloviários, que também não vem ao caso. Tem o empresário, também fora desta questão. E outras coisas mais.
Acho que o importante seria dizer que fui colaborador do Estado do Paraná, no Almanaque na época do saudoso Aramis Millarch, na década de 80. Fui escritor de crônicas diárias no ano de 1992 no Jornal do Estado. Fui dono da Livraria Ipê Amarelo, situada ali no início da Comendador Araújo, de 1990 a 1992. Publiquei a coletânea de poesia com Jairo Pereira, Desiré da Costa, Gerson Maciel e Luiz Alceu intitulada Varandaes, no ano de 1984. Publiquei em 1986 meu primeiro e único livro solo. O meu Paganini chamava-se Cais do Mar de Cima, que recebeu capa e ilustrações da Denise Roman. Durante três anos, de 1988 a 1990 mantive intensa correspondência literária com a Helena Kolody. Depois de 1992 me afastei das lides literárias até retornar, em 2008, com o site dos palavreiros, publicando poemas, crônicas e alguns artigos. Acho que é somente isto. O mais está por ser feito.”

Depois do terremoto e da contra-ode à canalha

Tonicato Miranda,  Curitiba

para Roberto Prado

Ah minha juventude estacionada
retardando todos meus legumes em flor
O que pode a couve flor contra a buganvília?
A bilha movendo meu carrinho de rolimã já vai longe
A trilha, o cavalo e a cilha transportam hoje um monge
Mãos e rosto ainda não de todo crestados
viajam de lado desviando do capim navalha da palavra
este que a juventude lavra sem perdão
desbastando com rudeza a montanha da emoção
Jovens passarinhos atenção ao meu canto de ferro
Acreditem: ele não será um solitário berro
está vestido de acordes é voz que segue a partitura
mas sua voz é livre, sua juventude tem a carne dura
mas minha pele se cresta, meu cantar já se arrasta
mas não me raspa com a borracha sobre o papel
minha linguagem é menos o sal, muito mais o mel
Convido-o companheiro para eu lhe ouvir poemas
traga aos meus ouvidos suas tralhas
vou também lhe mostrar minhas produções canalhas
vá que alguma encontre em você um abrigo?
Vá que ela seja o ferrolho da porta se abrindo
você um amigo?

Prosa de boca e beijo

Tonicato Miranda,  Curitiba

para Cleto de Assis

Agora tudo já se apresenta acalmado
Agora tudo se deita, dorme acamado
Até o rio corre sussurrando ou calado
Já pode o homem de costas ser amado

Águas passam tranquilas sob a ponte
as matas refletem mil verdes ao olhar
pássaros e insetos revoluteiam no ar
e até o sol não mais queima a fronte

Depois da tempestade e da enxurrada
quando tudo foi tropeçando em montes
terras, carros, mobílias, gritos e gentes
uma loura flor nasceu, e não foi tragada

Agora tudo já se apresenta acalmado
vaidades sentam-se para conversar
com novas mobílias na sala de estar
falam sorrindo com seus perfis de lado

Agora tudo se deita, dorme acamado
velho pano de centro na mesa da vovó
apara o prato com doces e pães de ló
também esconde as cicatrizes calado

Até o rio corre sussurrando ou calado
quem nisto acreditar certo se engana
ele dormita acumulando a nova gana
tragédia futura para se deixar ao lado

Já pode o homem de costas ser amado
agora é hora de servir pães de queijo
misturados à prosa de boca e beijo
é tempo de deixar tudo desassanhado

Curitiba, 21/05/2010

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Ilustração: C. de A.

Onde está Rui Moio? Em Terras do Fim do Mundo

Na Internet fazemos amigos a cada momento. Uns apenas de relacionamento fugaz, outros com laços seguros, como se os conhecêssemos fisicamente. Outros há que são apresentados por amigos virtuais e chegam com bagagem de parente, sem maiores formalidades. Assim veio Rui Moio, apresentado por Vera Lúcia Carmona. Natural de Angola, que ele define como “Terras do Fim do Mundo, onde a África é mais África”.

Diz também que, “aos 25 anos,  rumou numa ponte aérea  para a ex-metrópole portuguesa  e, desde então, vive refugiado em Lisboa. Identifica-se como lusófono. Com uns 12 a 13 anos, nas namoros de adolescente, ensaiou as primeiras quadras… ingénuas e de rima forçada… Voltou a poetar entre os 20 e 22 anos. Depois parou, para retornar a estas coisas há uns anos. Hoje tem uns 200 poemas e meia dúzia deles foram publicados no blog Sentires Sentidos – Poemas da minha preferência “. Ele também edita um blog de reflexões denominado Alma Viva, além de Antologias e Quadros Estatísticos.

O presente post demorou a sair. Primeiro, uma troca de correspondência para extrairmos um mínimo de dados biográficos do poeta angolano. Depois a demora no envio de tímidas fotos, que talvez acusassem o espírito de recolhimento do confesso refugiado. Mas agora, já na qualidade de correntista do Banco da Poesia, que ele pretigiou com citações em seu blog. já desde o ano passado, esperamos que sua presença seja contínua, para o prazer dos nossos leiotres.

No poema abaixo, um autodefinição. Sobre estes versos, falou Vera Lúcia:

Um poema que deixa transparecer o quanto o seu coração continua impregnado desse amor pátrio que não enfraquece nem com o passar dos tempos, nem com barreiras.
Admiro esse patriotismo, tão raro nos dias que correm. E, pelos vistos, ao raiar do dia, a inspiração chega-lhe mais forte do que nunca. E as recordações nostálgicas de Angola, contribuiram para que este poema lindo saísse como saíu.

Rui Moio


De braço ao alto, quebrado
Como num salve
Do Império antigo e longínquo
De que somos a argamassa.
Moio, Moio yobé
Foi emoção forte
Que ficou de Cangamba
E por nome,
O nome que o pai deu
Lá na Missão do fim do Mundo
Gigantesca de obra
No Império novo de que somos parte.
De uma união mista
De História, de grandeza, de heroicidade
De sacrifício nunca cobrado
De décadas e de séculos de comunhão
Foi parido no chão quente
Um escrevinhador que se alimenta de emoção.
Mentalmente elaborado na cama, na casa da Quinta Nova, na manhã de 31Ago2009.
Recolhido pelo Banco da Poesia em Sentires Sentidos

Vila Arriaga

Paredão a pique que quase toca o céu
Medonho, assustador
Os meninos e os adultos
vivem temerosos
Das zangas do paredão

A qualquer momento
Podem chover sobre a vila
Toneladas de pedras
Toda a montanha

Quando chove
A mulola ruge
Como um trovão em contínuo
Ela leva as águas envenenadas
Na guerra dos mucubais

Vila de duas ruas,
Estação do caminho de ferro
Com hotel sem hóspedes
E pensão para gente de passagem

Tem laranjeiras grandes a meio da avenida
Escola primária com nome de escritora
Que no puto dá prémio de literatura

Quinta do administrador
Com árvores grandes e antigas
E tanque para a criançada malandra se banhar

Tem colina com miradouro
Com barulhentos lagartos de duas cores
Onde só os meninos lá chegam
Por falta de caminho bom

No sopé da colina, em casa pequenina
Habita o velho primo
Colono antigo de Vila Arriaga

Aos fins de tarde
Lá vai ele, pé ante pé
Juntar-se à cavaqueira
Com o Rocha Pinto e o Duarte

O Lauro, comerciante antigo
É o mais querido de todos
Vende fuba, peixe seco, remédios…
E um pouco de tudo o resto

Tem hospital grande
Casa do médico e do enfermeiro
E até uma ambulância desconcertada
Uma vermelha Harley com side car

Vila de gente festeira
Com muita rapariga casadoira
Tem recinto para festas
Com tecto de buganvílias em flor
Lá dentro há churrasco, rifas,
pista de dança animada com a manivela
de um velho gromofone

Ao lado do pau-bandeira
E diante da administração
É ver uma molemba grande
Que atapeta de vermelho todo o chão

Passou por lá um administrador
Fausto Ramos de seu nome
É dele a traça do clube
do parque infantil com piscina
E é dele a obra da horta e do tanque para a regar

Rui Moio – 18 de outubro de 2004

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Ilustrações: C. de A.

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Gente de Cangamba

A igreja de Cangamba foi inaugurada em 1964 ou 1965. Levantou-se rapidamente, ao lado da avenida antiga de eucaliptos. Veio a guerra russo-cubana e a destruição da airosa vila, mas… a semente da religião ficou com os sobreviventes. Eis aqui um hino ao Senhor à maneira tão bela dos coros gentílicos dos kalutchazes. E a procissão percorre a linda e histórica avenida de eucaliptos…
Rui Moio

Brasília nos conformes do candango de Roberto Klotz

Muitas homenagens literárias foram feitas a Brasília pela pasagem dos seus cinquenta anos. O  Bar do Escritor também fez sua festa e reuniu várias colaborações de poetas e escritores brasilienses. Um texto despertou-me a atenção, pois descreve muito bem o que é a cidade e a relação que mantém com seus moradores. Conversei com o autor, Roberto Klotz, um engenheiro/escritor que trocou São Paulo por Brasília. Ele autorizou a publicação no Banco da Poesia e seu texto já está lá, na página de Crônicas. É a de nº 7. Boa leitura!

Minas pede a palavra: fala o poeta Flávio Otávio Ferreira

Flávio Otávio Ferreira nasceu em outubro de 1980, em João Monlevade. Mas ele se considera um belavistano (de Bela Vista, também MG). É graduado em Letras pelo Centro Universitário de Araxá, cidade na qual reside atualmente. Tem  poemas publicados em várias antologias. Em 2005, lançou, pela Litteris Editora, o seu livro de estreia Cata-ventos, o destino de uma poesia, que participou da 12ª Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro. Em 2007, foi contemplado com a 2ª colocação no I Prêmio Solar de Literatura João Monlevade 43 anos, com o texto Poema Insano. Ainda em 2007, obteve a 3ª colocação no 7º Concurso Estadual de Contos promovido pelo Clesi – Clube dos Escritores de Ipatinga, com o conto  A Mutação.  Em 2009, publicou o livro Itinerário Fragmentado, pelo selo Quártica Premium da Litteris Editora, lançado na 14ª Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro. Seus textos podem ser lidos nos blogs Misantropia , Manufatura (todo dia 7 do mês) e Poema Dia (todo dia 19 do mês).

Nossas boas vindas ao novo correntista do Banco da Poesia.

Recado ao Poeta

Flávio Otávio Ferreira

A morte me assombra o sono,
Deveras, ainda vivo em sonho.
No peito entreaberto
Mal cabe o coração palpitante.
A alma, em frangalhos,
Se vê partida por mil adagas
E, em desespero,
choro em um quarto escuro.

Pobre poeta!
Por que te envenenas em versos?
Quais os objetos de tuas conjecturas?
Que olhos? Que boca? Que sorrisos?
Há na distância das noites estelares
O brilho que se apaga nas horas escuras?
Há na ausência que te move
O tato a tocar de leve em nuvens?

Pobre poeta!
Por que não mergulhas no Ganges,
No Sena, no Reno, no Tietê, no Piracicaba?
Se joga do alto da ponte
Submerge nas águas turvas
E some, consome esses versos
Leva embora estes sonhos que te sufocam.
Por que se perder em amores vãos
Se tens mais a viver para ti?
Exorciza em teu pobre peito
O que o tempo, inexpressivo,
Não pode apagar.
Arranca-lhe o coração
E joga às aves de rapina
Que te espreitam ao longe.

Pobre poeta!
Escolhestes o lado errado da estrada!
Escolhestes o pior dos desertos!
Enquanto buscares na poesia o teu consolo
Terás apenas o desfavor dos versos
Que se amontoam em escombros.
Ruínas que se erguem vertiginosamente
Em teu peito enfurecido.
Logrará, contigo, pobre destino
E, talvez, um dia, tuas próprias mãos
Consigam limpar o sangue
Que jorra em torrentes
Nestas pautas encardidas.

Loucura e silêncio

Não fosse esta loucura
serias mais que abstração nesta linguagem de ícones
que se movem como formigas gigantescas
a carregar consigo as lembranças.
Não fosse este silêncio
regressarias de tuas viagens, mesmo com ressaca de viver
ou tédio a corroer tuas esperanças que em vão
se movem como ratos a remexer latas na dispensa.
Não fosse esta loucura
estarias presente em meu cubículo a bater-me na cara,
coagindo-me a dizer mentiras que te agradam,
apenas para salvar-te da névoa que encobre teu rosto.
Não fosse este silêncio
viria possuir-me o teu espírito em noites sem lua
em tempos de mistério e sombra, simplesmente
pra fazer gracejos e brincar sobre meu corpo quente.
Não fosse esta loucura
não serias só palavras rabiscadas por mãos trêmulas
em muros carcomidos, onde a alvura da cal
não esconde os desfavores do tempo.
Não fosse este silêncio
não terias ido embora pra longe destes olhos
deixando a este louco apenas o consolo
de versos obscenos no espelho do banheiro.
Mas, terias me libertado.
Desatando os nós que nos envolvem;
quebrando este silêncio que devora
as entranhas sufocando em nós o ânimo.
Quebraria este espelho que revela
a nossos olhos as misérias
a que nos condenamos;
Romperia o cordão que injeta em nós venenos.
Abortaria, pois, este desvanecimento
que nos rouba lentamente um do outro,
tornando loucura a tudo que um dia
dissemos querer da vida.

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Ilustrações: Cleto de Assis

Coelhinho da Páscoa, que trazes pra mim?

Um ovo, dois ovos, três ovos, assim!

Tem criança que não gosta de ovo de galinha, mas nunca vi alguém rejeitar ovo de chocolate. E no domingo de Páscoa os adultos também se transformam em crianças gulosas e ajudam a saborear as gostosuras que o Coelhinho traz para todo mundo.

Os povos antigos – muito antes dos Judeus e Cristãos terem transformado a Páscoa em data tradicional de seus respectivos ritos, embora por diferentes motivos – celebravam a chegada da Primavera com homenagem a  Eostre ou Ostera, deusa da estação das flores, das plantas renovadas, das árvores mais uma vez enverdecidas e também da época de reprodução de muitos animais. Ela também é conhecida como Eostra, Eostrae, Eastre e Estre. Note-se que Páscoa em inglês é Easter e em alemão Ostern, com certeza palavras derivadas do nome da deusa

Eostre, deusa pagã da Primavera

Eostre tinha sempre em suas mãos um ovo, a simbolizar o início de nova vida. Junto a ela, o coelho, símbolo da fertilidade. As antigas lendas que envolvem a sua história têm explicação para isso.

Seu nome tem origem no advérbio anglo-saxão ostar, que quer dizer sol nascente ou “sol que sobe. Daí sua associação com a aurora e, depois, com a luz radiante da Primavera, estação que trazia alegria para o povo e coisas boas para a mãe Terra.

Os gregos também tiveram uma deusa para a Primavera e seu nome era Eos. E eos, em grego, quer dizer aurora. Também há quem a identifique com Ishtar e Astarte, respetivamente deusas da Primavera da Babilônia e da Fenícia.

As lendas também contam que Eostre nutria predileção por crianças, que a seguiam por onde passasse. A deusa cantava e brincava com elas. Em um desses encontros, um pássaro pousou nas mãos de Eostre. Ela, então, pronunciou palavras mágicas e transformou o pássaro em seu animal favorito, uma lebre. Embora as crianças tivessem se maravilhado com a magia, meses mais tarde notaram que a lebre não se mostrava alegre, já que não podia mais voar ou cantar. Pediram, portanto, que a deusa retirasse o encantamento, mas suas tentativas foram em vão. Explicou às crianças que, como já estavam no Inverno, suas forças mágicas estavam diminuídas. Mas tentaria novamente na próxima Primavera.

Quando a Primavera retornou, Eostre fez com que a lebre voltasse à forma original de pássaro, durante certo tempo. Grato à deusa, o pássaro botou ovos em sua homenagem. E, também em consideração às crianças, que pediram sua liberdade, o pássaro, quando novamente voltou a ser uma lebre, pintou os ovos e os distribuiu em todo o mundo.

E acabou-se o que era doce.

Acabou não, porque amanhã tem mais chocolate.

Voltemos à Poesia

De grão em grão, a galinha enche o papo. E de ovo em ovo, podemos encher cestas de alegria e cornucópias de Poesia, já que estamos falando de fertilidade e fartura. Fui buscar ovos nos ninhos de Calíope, Polímnia, Euterpe e Erato e elas me ofertaram uma preciosiade: um poema talvez inspirado diretamente pelas musas, em seus tempos de mando no Olimpo, em companhia de Apolo. Trata-se do primeiro poema visual da história da Poesia, composto três séculos antes de Cristo, por Símias de Rodes. Abaixo, uma imagem do poema original, com duas dificuldades: é quase ilegível e o texto está escrito em grego antigo.  Em seguida, a exímia versão para o Português, feita pelo poeta brasileiro José Paulo Paes. Como a composição de J. P. Paes foi feita, em suas primeiras publicações, em outros sistemas gráficos, utilizei novos programas para “ovalar” melhor o poema.  Sobre o tradutor e o tema dos poemas visuais o Banco da Poesia se dedicará, em breve. (C. de A.)

O Ovo, de Símias de Rodes, versão de José Paulo Paes


E chegamos ao dia 12 de março de 2010

Há exatamente um ano, apertei o comando publicar na área de administração do novo blog, nascido da vontade de colaborar com a divulgação da Poesia. Apresentado sob a forma de um poema, o Banco da Poesia partia de um capital em branco para tentar acumular, ao longo do tempo, em suas projeções de lucros, o tesouro inestimável da comunicação e da sensibilidade humana.

Por isso, caros senhores,
vamos fundar nosso banco:
não obrará em vermelho
mas ainda está em branco.
Trabalhará vanguardeiro
sem pensar só em dinheiro
neste tempo de consumo.
E terá como seu prumo
a palavra desprezada
pelos praxistas do dia.

Hoje, ao fazermos o nosso primeiro balanço anual, notamos que passamos todo o tempo da crise financeira mundial sem contabilizar prejuízos. Ao contrário, os correnstistas foram crescendo e, juntamente com nomes já consagrados na história da literatura, novos poetas foram se juntando, pouco a pouco, em torno da idéia de comemorar permanentemente a boa poesia. Que, em resumo, assume a gratíssima missão de fazer fluir os melhores ideais de busca da beleza e do contínuo aperfeiçoamento espiritual.

Seja a Poesia lapidada por pensamentos sublimes, seja fortemente talhada por dores e desilusões, o certo é que ela abre a alma das pessoas e aponta para a harmonia do espírito. Assim é a Arte, assim todas as artes.

Por sorte minha, de forma espontânea, o querido amigo e poeta Manoel de Andrade amenizou as minhas preocupações de prestador de contas obrigado a um balanço anual, mandando-me um artigo minucioso que mostra o panorama que se desenhou ao longos destes doze meses. Ver abaixo.

De minha parte, olhando para o que passou, concluo que valeu a pena. Sem alarde, divulgando o blog primeiramente entre os amigos, depois recebendo adesões espontâneas de outras cidades, estados e de outros países, alargamos o nosso círculo de amizades. Nos primeiros seis meses, contabilizamos uma média de 40 visitações diárias. Nos últimos seis meses, a média subiu para 100 e continua aumentando a cada dia que passa. Ainda é pouco, diante dos gigantecos números da Internet, mas consideremos que o tema escolhido não é dos mais populares. E é exatamente para isso que estamos a trabalhar: para fazer da Poesia um hábito rotineiro na vida das pessoas. Um dia a gente chega lá.

Para comemorar o primeiro ano, procurei reunir um bom grupo de colaboradores em uma página especial. Fiz a eles um simples convite: para você, O que é a Poesia? (clique nos links anteriores ou no título do menu à direita)

Quase todos os convidados mandaram suas colaborações ainda em tempo para podermos soprar a velinha. Outros se excusaram e prometeram enviar suas palavras em seguida, Como estamos em uma ambiente virtual, não há portas inteiramente fechadas e, assim, todas as colaborações poderão ser publicadas a qualquer tempo.

Agradeço aos amigos, colaboradores e visitantes  a confiança e o permanente incentivo a este trabalho. (C. de A.)

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Minha Aldeia

Manoel de Andrade/Curitibaxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

Há um ano o Banco da Poesia abriu suas portas honrando-me com o crédito do primeiro depósito.  Quero pedir licença ao seu editor para chamar –  dramatizando meu enredo neste texto –, essa bela instituição pelo mágico nome de Aldeia da Poesia. Na verdade, é com essa imagem, poética e despojada, que eu sinto este site. E é pra esse recanto que  viajo todo dia.

É também minha Pasárgada, onde, literalmente, sou amigo do rei. Gosto de andar, pra cima e pra baixo, ao longo desse território virtual  de líricas alamedas,   galerias de arte,  parques e jardins construídos genialmente com formas e cores cletianas e densamente povoado de versos.

Ao longo deste ano quase uma centena de poetas ali chegaram para ficar. Pela leitura e pelos traços biográficos, já conheço a todos. Quero citar aqui os seus nomes e desde já peço perdão por minhas palavras não poderem  se referir a cada um, diante de tanta qualidade literária.

Minha renovada alegria é estar convivendo nessa aldeia com tantos amigos fraternos: Cleto, Vidal, Walmor, Marilda, Hélio, Simões, João Batista, Solivan, Débora O’Lins

Sob as luzes da memória, em seus caminhos   transitam  Neruda, Garcia Lorca, Fernando Pessoa e Benedetti e os  nossos  Castro Alves, Gregório de Matos, Vinícius, Drummond, Quintana, Augusto dos Anjos, Ferreira Gullar. Mais adiante  me  surpreendo com a presença de Otávio PazEmily DickinsonAntonio Machado e, mais ao longe, vejo com tristeza Alfonsina Storni caminhando solitária para o mar.

Retomo outros caminhos dessa Aldeia, atravesso seus jardins  e vejo sob um caramanchão quatro poetas que falam e gesticulam. São eles e elas:  Verlaine e Cora Colalina e, no  banco em frente,  Helena Kolody e Baudelaire. A poucos metros,  numa tenda com bom vinho português,  confraternizam  Miguel Torga, Antonio GedeãoAgostinho da Silva, José Dias Egipto, Eugênio de Andrade e Sophia Andressen.

Detenho-me, aqui e ali, “ouço” seus versos e sigo adiante  porque quero conhecer a todos. Chego a um pequeno bosque, frondoso e perfumado  onde se reúnem tantas nacionalidades da poesia e ali ganho meu dia.  São os  que vieram de além mar: Vera lúcia Kalahari, amiga querida que só conheço na saudade e na distância de Angola e Portugal; o grande Mia Couto, de Mocambique;  Sarah Carrère, do Senegal, que conheci recentemente;  Crisódio Araujo, Fernando Sylvan, José Barros Duarte, Jorge Lanten, Ruy Cinatti e Sophia Andressen, essa pleiade de ótimos poetas que enriquecem a literatura do Timor; e, bem assim,  Armênio Vieira e Corsino Fortes de Cabo Verde; e também Emmelie Prophète e Rodney Saint-Eloi, do Haiti.

Vem da poética Espanha os cantos  de Francisco Cenamor e Artur Alonso. Da pátria de Goethe, de Schiller e de Hölderlin chegam os versos de Herman Hesse e da lendária Bagdá, a poesia de Dunya Mikail.

Os hispano-americanos estão chegando e aqui já estão  Vicente Gerbasi, da Venezuela, e Guadalupe Amor, do México,  Álvaro Miranda, da Colômbia e Tejada Gomez, da Argentina, além da quase mitica mexicana Sóror Juana de La Cruz.

Há, nessa aldeia,  um nicho construído pela  saudade e pela esperança de um soldado russo que partiu para a guerra. Espera-me,   escreveu comovido  Konstantin Simonov à  sua amada. Creio ser um dos mais belos poemas,  nesse rastro de belezas que encontro nessa aldeia, e que Hélio do Soveral genialmente imortalizou na língua portuguesa.

No fundo de um vale há uma pequena pedreira disposta de forma circular, formando, naturalmente,  um teatro de arena. Chego até lá e encontro poetas brasileiros de todas as partes do país para um grande  festival de poesia. Sou um dos convidados para partilhar meus versos com   Maurício Ferreira, Isaias de Faria, Rafael Nolli, Saramar Mendes de Souza, Anair Weirich, Raul Pough, Erly Welton, José Marins, Luiz Adolfo Pinheiro, Murilo Mendes, Domingos Pellegrini, Oswald de Andrade, Juca Zokner, Oscar Alves, Iriene Borges, Mauricio Ferreira, Cássio Amaral, Rafael Nolli e possivelmente mais alguns que ainda não encontrei por aqui.

Esta a Minha Aldeia, já global pela magia tecnológica, mas ainda acolhedora e solidária pela graça da Poesia.

Curitiba- março de 2010

Primeiro aniversário

No próximo dia 12 de março o Banco da Poesia completará seu primeiro ano de vida. E, como toda organização bancária que se preza, deverá publicar seu primeiro balanço anual. Mas, à diferença das entidades financeiras, esquecerá os números e resultados
materiais. Queremos comemorar tão somente os dividendos culturais que possamos ter acumulado nestes doze primeiros meses de existência. Meses de permanente contato com um seleto grupo de pessoas que ama a poesia e sabe que a arte, bem além das ideologias, une as pessoas e as remete aos mundos imensuráveis dos sentidos e da fraternidade.

Lembrei-me agora de Gilberto Gil. Quando o mundo percebeu que homem poderia passear fisicamente na Lua, a eterna bola de queijo dos namorados, Gil tratou de passar um alerta musical, em sua Lunik 9:

Poetas, seresteiros, namorados, correi
É chegada a hora de escrever e cantar
Talvez as derradeiras noites de luar
Momento histórico, simples resultado do desenvolvimento da ciência viva…

E não é a Internet também um simples-grande resultado da ciência viva? A magia dos luares não morreu, como temia o compositor. Em vez da morte das noites enluadas, estemunhamos o nascimento de uma grande nuvem eletrônica a possibilitar um encontro cada vez mais próximo entre as pessoas, mesmo as geograficamente separadas por grandes distâncias.

É interessante notar que tudo foi resultado da corrida espacial da guerra fria entre os Estados Unidos e a então União Soviética, que se estendeu entre 1945 (fim da Segunda Guerra Mundial) e 1989 (queda do Muro de Berlim). A Internet, originada em um plano de segurança de informações criado pelo exército norte-americano, na década de 60, uniria mais que separaria, para a felicidade geral das nações.

Graças à magia da comunicação eletrônica, em um ano fizemos amigos em várias partes do mundo. Em 365 dias, estamos a revelar novos poetas, que passaram a partilhar o mesmo espaço com aedos já consagrados.

Teremos, portanto, muitas razões para fechar nosso balanço positivamente.

Isaias 1:02

Isaias de Faria

Todo profeta é um poeta. Usa suas metáforas para predizer acontecimentos futuros e fazer advertências às ovelhas  tresmalhadas. O livro de Isaías, por exemplo, com seus 66 capítulos, é até mesmo na forma um livro de poemas. Como diria nosso Manoel de Andrade, poemas brabos, por certo. Recheados de metáforas ameaçadoras de um deus vingativo e insatisfeito com sua criação. Mas a poesia não canta apenas as venturas, o sol e as flores. O poeta vê beleza também na tempestade, nas nuvens escuras, na dor e nas lágrimas.

E por isso todo poeta é quase sempre um profeta. Porque consegue ver além da aparente realidade e prever cintilações e perfumes e cores e formas e fados que a maioria não consegue enxergar.

No dia 1º de fevereiro recebi uma mensagem de um novo Isaias, poeta, talvez profeta (daí a inscrição Isaias 1:02) que me disse querer publicar um poema seu no Banco da Poesia. Conversa vai, conversa vem, pedi foto, informações biográficas e eis aí Isaias de Faria, com resumidíssima folha corrida: poeta, mora em Belo Horizonte, escreve em seu blog Estações e em diversas revistas eletrônicas e outros endereços da rede. Em breve publicará seu primeiro livro de poemas, com o título Distrações.

Grato ao Isaias poeta ( também fotógrafo) pelos depósitos iniciais. Aos nossos leitores podemos recomendar, como o Isaías profeta: “Aplicai os ouvidos para ouvir sua voz, / sêde atentos para escutar sua palavra” (Isaías 28:23).

O olhar de um jovem fotógrafo

Montagem sobre fotos de Isaias de Faria – C. de A.

Um casal. 20 ele, 29 ela.
1º dia de um encontro
pra se conhecerem
numa praça florida.
feriado. Dia absorto
em sua quietude:

ele: os dias nublados
são os melhores dias
pra fotografar

ela: melancólico… seus
olhos não negam

Para a poiesis de Homero

Illion

irá de imortal e covalente suplício
desbravar setadas confusas de virtudes
nas moradas falsamente desnudas

objetivante
revela completo
desta busca
turbulenta deidade
na raiz de pedra
épico como ele só

destino de contendas traça aquiles
papel de epopéia
sucessivas até a morte

semideuses num próprio céu

A Apoteose de Homero - Jean Auguste Dominique Ingres, 1827 – Museu do Louvre (Paris)

Odisseus

em que fala a
fonte erga
vibre
em que fala –semiviva, fornalha, estentor, adaga, lança,
fonte mire
incline
em que o
passado estentor
semiviva
de
fornalhas ditas
venha de irrealidade
que não se pode fugir
mas plangente

se vai sim a adaga,
lança, aço em mãos e
ostenta golpe afrente a
voltar
(tão caro nunca se foi, odisseu!)
ostente a volta

recalcando a lida (consumindo-se pelo extenso trilho)
prestes ao amor que volta:
não sabeis

certeza de quem se
arruma sabes
em flanco brilhante horrendo

fina farpa a cada ponto,
trancos, barrancos, barras
e amargas despalavras
sentias e tais tais azeus

e o tal zeus,
retoma as energias desfeitas,
nervos desarrumados
o corpo a avante e prevista ira,
não pode pasmar de ver
nada de dó de açoite
a almejada rota

prossiga,
já tens a terra em pés, pele,
tateamento nos céus

árduo estrategista de ouvidos atentos
no jogo cantado-lírico

orgulho ainda intacto
cravado e repouso atento mito

Revista Hispanista divulga a obra de Manoel de Andrade

Suely Reis Pinheiro é professora, pesquisadora e escritora que vive em Niterói, de onde envia para o mundo a sua preciosa revista eletrônica Hispanista, já há dez anos. Doutora em Literatura Espanhola e Hispano-americana e especialista em Literaturas Hispânicas e Literatura Comparada, ela dá aulas na Universidade Federal Fluminense – UFF, na Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ e na UNIGRANRIO.

Sua experiência pedagógica e a visão sobre o dinamismo da Internet no processo de comunicação social, levaram-na a criar a revista eletrônica. Ela explica melhor: “A idéia de criar uma revista eletrônica, que pudesse aglutinar a força dos hispanistas, surgiu daí; apostando numa revista que disponibilizasse espaço, na grande rede e que pudesse ser consultada e utilizada, não só pelos hispanistas do Brasil, mas também de outros países“. E mais: “Neste começo de século, quando queremos, cada vez mais, intercambiar conhecimentos e experiências, a revista Hispanista aproveita o inegável valor comunicativo da Internet e se abre ao diálogo, permitindo pensar, neste terceiro milênio, questões do hispanismo e seu vasto campo multidisciplinar“.

E por que o título Hispanista?

Porque ser um hispanista ― e o termo pode ser tomado no sentido amplo ― é estar enlaçado pelos estudos hispânicos. Hispanistas somos todos, quando nos debruçamos sobre a Língua Espanhola e as Literaturas Espanhola e Hispano-Americana… uma revista aberta a várias tendências e linhas de pesquisa da área hispânica, abarca, por ser uma revista virtual, um horizonte bem mais largo do que o das revistas nãovirtuais. Reúne, em viagem intelectual, pessoas envolvidas no processo de intensificação e de divulgação das ‘cosas hispánicas’, e promove, no âmbito da reflexão e da análise, uma
instigante troca de experiências, idéias e enfoques
“.

Ela informa, ainda, que a “revista abre espaço para divulgar o trabalho científico de estudiosos da hispanidade, possibilitando, também, ao sabor da intertextualidade, que pesquisadores de outras áreas atualizem a interdisciplinariedade, nas relações entre língua, literatura, história, artes plásticas, folclore, cinema, cultura… Com isso, um grande acervo comum, facilmente acessado por todos, vai sendo formado“.

Os trabalhos publicados passam por avaliação prévia de um conselho editorial formado por professores e especialistas em literatura, brasileiros e de outros países, como Argentina, Cuba, Venezuela e Espanha. Mantém correspondentes em vários estados brasileiros e no exterior.

Mas nem só de estudos acadêmicos vive Hispanista. Há pouco tempo Suely conheceu o trabalho poético do nosso Manoel de Andrade e, de quando em quando, os publica na revista virtual, além de outros textos. Para quem quiser ler os trabalhos de Manoel de Andrade já publicados na revista Hispanista, basta clicar nos ítulos abaixo. Alguns deles também foram postados aqui no Banco da Poesia.

Começamos pelo último número (Vol X I nº 40, correspondente ao trimestre de janeiro,  fevereiro e marçoo de 2010).

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Manoel de Andrade, o poeta que escreveu para toda a América Latina

Artigo do jornalista Julio Daio Borges, publicado na revista eletrônica Digestivo Cultural

Recado à mulher amada

Poema

Canção de amor à América

Poema

Por que cantamos

Poema

Véspera

Poema

Canção para os homens sem face

Poema

Poesía y Oralidad

Ensaio

Otto René Castillo: O sonho e o martírio de um poeta

Artigo

Manoel de Andrade e Ferreira Gullar: poetas da resistência

Entrevista concedida ao jornal A Tarde, de Salvador, Bahia

Parabéns à professora Suely, por seu importante trabalho e ao poeta Manoel de Andrade, pelo reconhecimento que sua obra vem obtendo em todas as partes.