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Inéditos de Cássio Amaral, em nova praia

Cássio Amaral deu um pulo no mapa do Brasil: mudou-se de Araxá, MG, para Barra Velha, em Santa Catarina. E seu novo endereço não poderia ser melhor para um poeta: Rua dos Crisântemos,Condomínio Lagoa Azul. bairro Quinta dos Açorianos. De lá nos manda alguns depósitos, já com sabor de sal do Atlântico catarinense. Quem quiser recordar os depósitos anteriores, ver aqui e aqui.

Elevação científica

Cássio Amaral, Barra Velha


O cúmulo na prancha
surfar Foucault
na economia de Bérgson
deixar dentro do corpo
Hendrix  sabatinar o povo
Olha, olha lá!
A onda vem dobrando
a maré num hipertexto de Rousseau
com Thomas S Kuhn:
“A Estrutura das Revoluções Científicas”
A areia tem pegadas de Newton?

Tributos

pagar as contas dia 10
na metida
do mês.

26/04/2010

E chegamos ao dia 12 de março de 2010

Há exatamente um ano, apertei o comando publicar na área de administração do novo blog, nascido da vontade de colaborar com a divulgação da Poesia. Apresentado sob a forma de um poema, o Banco da Poesia partia de um capital em branco para tentar acumular, ao longo do tempo, em suas projeções de lucros, o tesouro inestimável da comunicação e da sensibilidade humana.

Por isso, caros senhores,
vamos fundar nosso banco:
não obrará em vermelho
mas ainda está em branco.
Trabalhará vanguardeiro
sem pensar só em dinheiro
neste tempo de consumo.
E terá como seu prumo
a palavra desprezada
pelos praxistas do dia.

Hoje, ao fazermos o nosso primeiro balanço anual, notamos que passamos todo o tempo da crise financeira mundial sem contabilizar prejuízos. Ao contrário, os correnstistas foram crescendo e, juntamente com nomes já consagrados na história da literatura, novos poetas foram se juntando, pouco a pouco, em torno da idéia de comemorar permanentemente a boa poesia. Que, em resumo, assume a gratíssima missão de fazer fluir os melhores ideais de busca da beleza e do contínuo aperfeiçoamento espiritual.

Seja a Poesia lapidada por pensamentos sublimes, seja fortemente talhada por dores e desilusões, o certo é que ela abre a alma das pessoas e aponta para a harmonia do espírito. Assim é a Arte, assim todas as artes.

Por sorte minha, de forma espontânea, o querido amigo e poeta Manoel de Andrade amenizou as minhas preocupações de prestador de contas obrigado a um balanço anual, mandando-me um artigo minucioso que mostra o panorama que se desenhou ao longos destes doze meses. Ver abaixo.

De minha parte, olhando para o que passou, concluo que valeu a pena. Sem alarde, divulgando o blog primeiramente entre os amigos, depois recebendo adesões espontâneas de outras cidades, estados e de outros países, alargamos o nosso círculo de amizades. Nos primeiros seis meses, contabilizamos uma média de 40 visitações diárias. Nos últimos seis meses, a média subiu para 100 e continua aumentando a cada dia que passa. Ainda é pouco, diante dos gigantecos números da Internet, mas consideremos que o tema escolhido não é dos mais populares. E é exatamente para isso que estamos a trabalhar: para fazer da Poesia um hábito rotineiro na vida das pessoas. Um dia a gente chega lá.

Para comemorar o primeiro ano, procurei reunir um bom grupo de colaboradores em uma página especial. Fiz a eles um simples convite: para você, O que é a Poesia? (clique nos links anteriores ou no título do menu à direita)

Quase todos os convidados mandaram suas colaborações ainda em tempo para podermos soprar a velinha. Outros se excusaram e prometeram enviar suas palavras em seguida, Como estamos em uma ambiente virtual, não há portas inteiramente fechadas e, assim, todas as colaborações poderão ser publicadas a qualquer tempo.

Agradeço aos amigos, colaboradores e visitantes  a confiança e o permanente incentivo a este trabalho. (C. de A.)

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Minha Aldeia

Manoel de Andrade/Curitibaxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx

Há um ano o Banco da Poesia abriu suas portas honrando-me com o crédito do primeiro depósito.  Quero pedir licença ao seu editor para chamar –  dramatizando meu enredo neste texto –, essa bela instituição pelo mágico nome de Aldeia da Poesia. Na verdade, é com essa imagem, poética e despojada, que eu sinto este site. E é pra esse recanto que  viajo todo dia.

É também minha Pasárgada, onde, literalmente, sou amigo do rei. Gosto de andar, pra cima e pra baixo, ao longo desse território virtual  de líricas alamedas,   galerias de arte,  parques e jardins construídos genialmente com formas e cores cletianas e densamente povoado de versos.

Ao longo deste ano quase uma centena de poetas ali chegaram para ficar. Pela leitura e pelos traços biográficos, já conheço a todos. Quero citar aqui os seus nomes e desde já peço perdão por minhas palavras não poderem  se referir a cada um, diante de tanta qualidade literária.

Minha renovada alegria é estar convivendo nessa aldeia com tantos amigos fraternos: Cleto, Vidal, Walmor, Marilda, Hélio, Simões, João Batista, Solivan, Débora O’Lins

Sob as luzes da memória, em seus caminhos   transitam  Neruda, Garcia Lorca, Fernando Pessoa e Benedetti e os  nossos  Castro Alves, Gregório de Matos, Vinícius, Drummond, Quintana, Augusto dos Anjos, Ferreira Gullar. Mais adiante  me  surpreendo com a presença de Otávio PazEmily DickinsonAntonio Machado e, mais ao longe, vejo com tristeza Alfonsina Storni caminhando solitária para o mar.

Retomo outros caminhos dessa Aldeia, atravesso seus jardins  e vejo sob um caramanchão quatro poetas que falam e gesticulam. São eles e elas:  Verlaine e Cora Colalina e, no  banco em frente,  Helena Kolody e Baudelaire. A poucos metros,  numa tenda com bom vinho português,  confraternizam  Miguel Torga, Antonio GedeãoAgostinho da Silva, José Dias Egipto, Eugênio de Andrade e Sophia Andressen.

Detenho-me, aqui e ali, “ouço” seus versos e sigo adiante  porque quero conhecer a todos. Chego a um pequeno bosque, frondoso e perfumado  onde se reúnem tantas nacionalidades da poesia e ali ganho meu dia.  São os  que vieram de além mar: Vera lúcia Kalahari, amiga querida que só conheço na saudade e na distância de Angola e Portugal; o grande Mia Couto, de Mocambique;  Sarah Carrère, do Senegal, que conheci recentemente;  Crisódio Araujo, Fernando Sylvan, José Barros Duarte, Jorge Lanten, Ruy Cinatti e Sophia Andressen, essa pleiade de ótimos poetas que enriquecem a literatura do Timor; e, bem assim,  Armênio Vieira e Corsino Fortes de Cabo Verde; e também Emmelie Prophète e Rodney Saint-Eloi, do Haiti.

Vem da poética Espanha os cantos  de Francisco Cenamor e Artur Alonso. Da pátria de Goethe, de Schiller e de Hölderlin chegam os versos de Herman Hesse e da lendária Bagdá, a poesia de Dunya Mikail.

Os hispano-americanos estão chegando e aqui já estão  Vicente Gerbasi, da Venezuela, e Guadalupe Amor, do México,  Álvaro Miranda, da Colômbia e Tejada Gomez, da Argentina, além da quase mitica mexicana Sóror Juana de La Cruz.

Há, nessa aldeia,  um nicho construído pela  saudade e pela esperança de um soldado russo que partiu para a guerra. Espera-me,   escreveu comovido  Konstantin Simonov à  sua amada. Creio ser um dos mais belos poemas,  nesse rastro de belezas que encontro nessa aldeia, e que Hélio do Soveral genialmente imortalizou na língua portuguesa.

No fundo de um vale há uma pequena pedreira disposta de forma circular, formando, naturalmente,  um teatro de arena. Chego até lá e encontro poetas brasileiros de todas as partes do país para um grande  festival de poesia. Sou um dos convidados para partilhar meus versos com   Maurício Ferreira, Isaias de Faria, Rafael Nolli, Saramar Mendes de Souza, Anair Weirich, Raul Pough, Erly Welton, José Marins, Luiz Adolfo Pinheiro, Murilo Mendes, Domingos Pellegrini, Oswald de Andrade, Juca Zokner, Oscar Alves, Iriene Borges, Mauricio Ferreira, Cássio Amaral, Rafael Nolli e possivelmente mais alguns que ainda não encontrei por aqui.

Esta a Minha Aldeia, já global pela magia tecnológica, mas ainda acolhedora e solidária pela graça da Poesia.

Curitiba- março de 2010

Cássio Amaral: mais brilhos de Araxá

Foto e poema: Cássio Amaral – montagem: C. de A.

Araxá nos descobriu: Cássio Amaral também envia depósitos

Quem, em Araxá,
procurar da Poesia o Banco,
Axará?

O oeste mineiro nos descobriu. E nós estamos descobrindo a poesia do oeste de Minas.  Junto aos comentários sobre os poemas de Rafael Nolli, com L. antes, chegou mais uma proposta de abertura de conta no Banco da Poesia de Cássio Amaral. Também poeta jovem, professor e, como se vê nos seus trabalhos, em busca de novas linguagens, mesmo quando utiliza a antiga estrutura haicaiana. Saudamos o novo correntista, professor  de História, Filosofia e Sociologia no ensino médio. Ele nasceu e vive em Araxá, Minas Gerais. Autor dos livros Lua Insana Sol Demente (2001), Estrelas Cadentes (2003), Sem Nome (2006) e Sonnen (2008). Participou das coletâneas de autores blogueiros Corpo e Alma em Verso e Prosa (2006) e Trilhas (2008), organizadas por Euza Procópio Noronha. Tem poemas publicados nos endereços eletrônicos Diversos Afins, Germina Literatura, Revista Lasanha e site de Antonio Miranda.

Seu blog se chama enten katsudatsu . Nossas boas vindas a mais este araxaense e sua poesia.

Metafísica dos coiotes I

Rasgo o trago do imprevisto
que distrai o tempo que passa rápido.
Canto o cântico dos malditos que me cai.
Tudo vaza, tudo explode.
A noite é lenta quando lírios conspiram
contra a sorte perdida.
Lâminas que a incerteza jura fatiar para a salada
de nepotismo barato e regular da gargalhada da noite.
Bebo as estrelas virgens,
Como os meteoros platônicos,
latindo, uivando pra lua prostituta
que cavalga numa nuvem
o sexo santo dos devassos.

A Morte do Poeta


O poeta morreu
Balbuciando formigas em seus versos
Ficou obcecado por metáforas
Cuspiu pleonasmos pretéritos

O poeta morreu
Tentando achar seu caminho
Disse imperfeições nas metonímias
Atirou-se do nono  andar

O poeta morreu tentando desmontar a bomba atômica
Depois de ter punhetado Descartes buscando a verdade ao contrário
Verter-se em Paganini tocando seu violino diabólico
Esvoaçando flores carcomidas por aliterações fingidas

O poeta morreu
Nos precipícios lunáticos de toda a imperfeição
Uivando diante do absurdo da sua própria voz
Silenciada no êxtase da loucura.

Três Kai-kais

Hai-cães uivantes

um trovão instiga o uivo
a noite cai em mosaico
no verso latido de um pária

tirar leite das pedras
pisar na velocidade da luz
extrair a raiz sisuda do futuro.

Catador

catando palavras
desvirginando a métrica
endoidando a sintaxe.

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Ilustrações: C. de A.