A Secretaria-Geral da Presidência da República, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e o Movimento Nacional pela Cidadania e Solidariedade convidam para a solenidade de entrega do Prêmio ODM Brasil (3.ª Edição) e do Lançamento do 4.º Relatório de Acompanhamento dos Objetivos do Milênio.
A solenidade será realizada em Brasília, conforme segue:
Data: 24 de março de 2010 ( quarta-feira)
Horário: às 16 horas
Local: Centro de Convenções Ulysses Guimarães – Auditório Planalto
Endereço: SDC – Centro de Divulgação Cultural – Eixo Monumental.
Pois é… a boa notícia é que eu estarei lá, para receber esse prêmio juntamente com representantes da equipe da Secretaria Municipal de Educação que ajudou a implantar a Rede de Bibliotecas Escolares em Curitiba, o projeto premiado.
Iniciamos a Rede de Bibliotecas em 2005, quando tínhamos apenas os 45 Faróis do Saber. Hoje, são 170 bibliotecas municipais integradas por um sistema web que permite localizar qualquer título existente no acervo de mais de 700 MIL livros. O plano para o futuro é integrar também as bibliotecas da Fundação Cultural. Aí, serão mais de 1 milhão de livros catalogados para que ninguém nessa cidade tenha a desculpa de não ler. Todas as bibliotecas são abertas à população. É só procurar a mais próxima de sua casa.
Dos 1470 projetos avaliados pelo IPEA, foram premiadas as seguintes prefeituras:
– Prefeitura de Belo Horizonte (MG) – Prática: Programa Abastecer
– Prefeitura de Boa Vista (RR) – Prática: Programa Municipal de Saúde Indígena
– Prefeitura de Boa Vista (RR) – Prática: Projeto Estufa
– Prefeitura de Caculé (BA) – Prática: Coleta seletiva de materiais recicláveis
– Prefeitura de Campinas (SP) – Prática: Nave Mãe – Prefeitura de Curitiba (PR) – Prática: Rede Municipal de bibliotecas escolares de Curitiba
– Prefeitura de Novo Repartimento (PA) – Prática: Sustentabilidade ambiental através do cultivo de cacau, pelo SAF
– Prefeitura de Orós (CE) – Prática: Cozinha Comunitária – Nutrição à Mesa
– Prefeitura de Osasco (SP) – Prática: Vigilância da Criança com risco de mortalidade
– Prefeitura de Osasco (SP) – Prática: Recuperação de Minas e Nascentes.
– Prefeitura de Penápolis (SP) – Prática: Agricultura Urbana.
Marilda termina seu recado dizendo: ” Legal, né?”
E nós lhe dizemos: Mais que legal: maravilhoso. Já publicamos em outra ocasião, mas seu trabalho merece ser louvado com os belos versos de Castro Alves:
Depois do Dia Mundial da Poesia, vem o Dia da Água, outra substância indispensável para a sobrevivência humana. Produto da união de dois gases – um altamente inflamável e outro acelerador da combustão – a água tem a paradoxal capacidade de apagar o fogo e, em estado sólido, reduz drasticamente as temperaturas. Como imaginamos que esta sagrada siubstância jamais acabará, não somos exatamente os melhores guardiões da água, por este mundo afora. Desperdiçamos água, contaminamos e secamos nascentes, poluimos os mares e as grandes reservas de água potável. Daqui a 15 anos, segundo a ONU, mais da metade da população mundial, ou seja, perto de 3 bilhões de pessoas, sofrerá escassez de água. A organização também informa que hoje, a cada ano, morrem cerca de 1 milhão e 600 mil pessoas por dificuldades de acesso a água e falta de saneamento básico.
Como afirmou o escritor João Guimarães Rosa:
A água de boa qualidade é como a saúde ou a liberdade:
só tem valor quando acaba.
xxxxxxxxxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxxx
Água não é poesia, mas pode ser fonte inesgotável de inspiração poética. Por isso fomos pedir água a alguns poetas para comemorar o seu dia. E, no final do post, anexamos dois pequenos filmes que nos mostram o mundo maravilhoso da água, em sua origem e como fonte permanente de vida. Afinal, sempre é bom recordar que somos formados primordialmente de água: chegamos a conter até 80% do precioso líquido (até os dois anos de idade). Depois essa proporção decresce, com o passar dos anos. O que significa que, ao envelhecermos, simplesmente desidratamos. E, em um belo (ou feio) dia, vaporizamos literalmente.
Enquanto isso não ocorre, louvemos a água, nossa inseparável companheira. C. de A.
Nossa sabedoria é a dos rios.
Não temos outra.
Persistir. Ir com os rios,
onda a onda.
Os peixes cruzarão nossos rostos vazios.
Intactos passaremos sob a correnteza
feita por nós e o nosso desespero.
Passaremos límpidos.
E nos moveremos,
rio dentro do rio,
corpo dentro do corpo,
como antigos veleiros.
Luís Carlos Verzoni Nejar, (Porto Alegre, 11 de janeiro de 1939), é um poeta, ficcionista, tradutor e crítico brasileiro, membro da Academia Brasileira de Letras.
Prendei o rio
Maltratai o rio
Trucidai o rio
A água não morre
A água que é feita
de gotas inermes
Que um dia serão
Maiores que o rio
Grandes como o oceano
Fortes como os gelos
Os gelos polares
Que tudo arrebentam.
De Estrela da Manhã
Manuel Carneiro de Souza Bandeira Filho, poeta brasileiro (Recife, 19 de abril de 1886 – Rio de Janeiro, 13 de outubro de 1968)
Este líquido é água.
Quando pura
é inodora, insípida e incolor.
Reduzida a vapor,
sob tensão e a alta temperatura,
move os êmbolos das máquinas que, por isso,
se denominam máquinas de vapor.
É um bom dissolvente.
Embora com excepções mas de um modo geral,
dissolve tudo bem, ácidos, base e sais.
Congela a zero graus centesimais
e ferve a 100, quando à pressão normal.
Foi neste líquido que numa noite cálida de Verão,
sob um luar gomoso e branco de camélia,
apareceu a boiar o cadáver de Ofélia
com um nenúfar na mão.
De Poesiascompletas
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
António Gedeão, pseudónimo de Rómulo Vasco da Gama de Carvalho (Lisboa, 24 de Novembro de 1906 – 19 de Fevereiro de 1997), foi um afamado poeta, professor e historiador da ciência portuguesa.
Água, feita de volubilidade
mãe das nuvens e do barro.
posso senti-la discreta
transparente inevitável.
Prisioneira gelada
dos refrigeradores,
vago itinerário dos peixes,
húmido túmulo dos detritos
que os homens repudiaram.
Feita de angústia,
saíste dos olhos
para a estrada áspera
das rugas.
Ergues tua bandeira vermelha
no peito dos apunhalados.
Água,
hei-de beber-te comovido
na inodora volúpia
da tua acomodada transparência.
Embebes de esquecimento
os suicidas.
Tuas mãos rudes
agarram os continentes,
dissolvem os náufragos,
projectam no céu
os velames e as quilhas.
Bojo surdo e verde
cofre de algas e flibusteiros,
bactérias e diamantes.
Quero-te agora
inerte de presságios,
mera adolescente
nascida na terra,
filha perdida do azul.
No alto mar
A luz escorre
Lisa sobre a água.
Planície infinita
Que ninguém habita.
O Sol brilha enorme
Sem que ninguém forme
Gestos na sua luz.
Livre e verde a água ondula
Graça que não modula
O sonho de ninguém.
São claros e vastos os espaços
Onde baloiça o vento
E ninguém nunca de delícia ou de tormento
Abre neles os seus braços.
De Poesia (1944)
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
Sophia de Mello Breyner Andresen (Porto, 6 de Novembro de 1919 — Lisboa, 2 de Julho de 2004) foi uma das mais importantes poetas portuguesas do século XX.
Hoje, 21 de março de 2010, mais de cem países estão comemorando o Dia Mundial da Poesia, instituído pela UNESCO há dez anos, com o objetivo de defender a diversidade linguística.
O Banco da Poesia registra a data com um poema de Fernando Pessoa – Liberdade –, quase uma brincadeira literária, mas eternamente belo. Com uma versão musicada do mesmom poema, de autoria de Ronaldo Miranda, gravada no Recital de Graduação em Regência Coral da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em 2007, no Instituto de Artes daquela universidade, com a regente Luana Lied Zapata.
E publicamos, logo abaixo, o primeiro anúncio sobre Poesia, de uma série que vamos revelar pouco a pouco. Afinal, seria muito bom se a Poesia fosse considerada um bem de primeira necessidade e estivesse entre os produtos mais consumidos em nossa sociedade.
Liberdade
Fernando Pessoa
Grafismo sobre desenho de Almada Negreiros
Ai que prazer
não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
e não o fazer!
Ler é maçada,
estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
como tem tempo, não tem pressa…
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto melhor é quando há bruma.
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as danças…
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca…
Na página Crônicas, Manoel de Andrade faz uma resenha do filme Fogo sobre Cristal, um Diário Antártico, do escritor e cineasta paranaense Frederico Fullgraf. O filme retrata as paisagens geladas da Passagem de Drake, nas Ilhas Orçadas do Sul, Shettland do Sul e do Mar de Weddel, no setor leste da Península Antártida. Leia aqui.
A poesia de César Vallejo, até onde consegui conhecê-la, me parece dividida entre o culpar a sociedade pelas injustiças sociais e o assumir culpas produzidas por excessiva educação religiosa. Conta sua biografia que, membro de uma família com doze filhos, dos quais ele era o menor, estaria destinado a ser padre, o que era ou é comum nas famílias católicas da América Latina, em especial nos países hispanos, onde a tradição religiosa sempre foi mais arraigada. Ele mesmo teria admitido essa vocação, em sua infância, e deve ter recebido profunda influência no conhecimento bíblico e de toda a liturgia de sua crença, tanto que seus textos poéticos seriam, mais tarde, impregnados por essa mística, além do tema obsessivo da Vida e da Morte.
Vallejo viveu as contradições da sociedade européia da primeira metade do Séc. XX, contaminada e desgastada por duas grandes guerras e por acaloradas discussões ideológicas, notadamente pelo marxismo que organizara a União Soviética. Participou, como correspondente, dos conflitos da Guerra Civil Espanhola (1936-1939), o que lhe serviu até mesmo como inspiração poética.
Sua vida e obra bem demonstram que seus principais conflitos foram existenciais, dividido entre uma santidade que seus pais haviam presumido para ele e a revolta ante a injustiça social, que o levou a extremos caminhos políticos. Entretanto, dentro dele viveu um homem íntegro e um poeta completo. Talvez não tenha visto a realização do que sua esperança desenhava como um mundo diverso daquele que testemunhava em vida, mas com certeza tornou o mundo melhor com sua poesia. C. de A.
César Vallejo nasceu em 1892, em Santiago de Chuco, região andina localizada ao norte do Perú, no seio de uma família com origens espanholas e indígenas. Desde pequeno conheceu a miséria, mas conheceu o benévolo o afeto familiar. Longe de sua família, nunca escondeu que sofria de um incurável sentimento de orfandade.
Estudou na Universidade de Trujillo, cidade onde descobriu a boemia, influenciado por jornalistas, escritores e políticos rebeldes. Em Trujillo, Vallejo publicou seus primeiros poemas antes de chegar a Lima no final de 1917. Nesta cidade lança seu primeiro livro: Los Heraldos Negros (impresso em 1918, lançado em 1919), um dos mais representativos exemplos de pós-modernismo.
Casa de Vallejo, em Santiago de Chuco, Perú
Em 1920 faz uma visita a sua cidade natal e acaba se envolvendo em confusões que o levaram a cadeia, onde permaneceu por cerca de três meses. Esta experiência teve uma profunda influência em sua vida e em sua obra, refletindo diretamente em vários poemas de seu segundo livro, Trilce (1922), considerada como uma obra fundamental da renovação da linguagem poética hispanoamericana. Em Trilce Vallejo se afasta dos modelos tradicionais que, até então, havia seguido, adotando uma linha mais modernista e realizando um angustiante e desconcertante mergulho nos abismos da condição humana, que nunca antes haviam sido explorados.
No ano seguinte parte para Paris, onde permanecerá (fazendo algumas viagens a União Soviética, Espanha e outros países europeus) até o fim de seus dias. Em París, viveu em extrema pobreza e grande sofrimento físico e moral. Participa com amigos como Huidobro, Gerardo Diego, Juan Larrea e Juan Gris de atividades de cunho vanguardista, renunciando a sua própria obra Trilce e, em 1927, aparece firmemente comprometido com o marxismo em sua atividade intelectual e política. Escreve artigos para jornais e revistas, peças teatrais, relatos e ensaios de intenção propagandistas, como Rússia, em 1931. Inscrito no Partido Comunista da Espanha (1931) e designado para ser correspondente, acompanha os acontecimentos da Guerra Civil e escreve o
seu poema mais político: España, aparta de mi este cáliz, que aparece em 1939, impresso por soldados do exército republicano.
Toda a obra poética escrita em Paris e que Vallejo publicou parcamente em diversas revistas, apareceria postumamente naquela cidade com o título: Poemas Humanos (1939). Nesta produção é visível seu esforço em superar o vazio e o niilismo de Trilce
e em incorporar elementos históricos e da realidade concreta (peruana, européia, universal) com os que pretendem manifestar uma apaixonada fé na luta dos homens pela justiça e solidariedade social.
Hay golpes en la vida, tan fuertes … ¡Yo no sé!
Golpes como del odio de Dios; como si ante ellos,
la resaca de todo lo sufrido
se empozara en el alma… Yo no sé!
Son pocos; pero son… Abren zanjas obscuras
en el rostro más fiero y en el lomo más fuerte.
Serán talvez los potros de bárbaros atilas;
o los heraldos negros que nos manda la Muerte.
Son las caídas hondas de los Cristos del alma,
de alguna fe adorable que el Destino blasfema.
Esos golpes sangrientos son las crepitaciones
de algún pan que en la puerta del horno se nos quema.
Y el hombre… Pobre… pobre! Vuelve los ojos, como
cuando por sobre el hombro nos llama una palmada;
vuelve los ojos locos, y todo lo vivido
se empoza, como charco de culpa, en la mirada.
Hay golpes en la vida, tan fuertes… Yo no sé!
Grafismo sobre gravura de Albrecht Dürer
Os Arautos Negros
Há golpes na vida, tão fortes … Eu não sei!
Golpes como do ódio de Deus; como se ante eles,
a ressaca de todo o sofrido
se empossara na alma… Eu não sei!
São poucos; mas são… Abrem valas obscuras
no rosto mais feroz e no dorso mais forte.
Serão, talvez, os potros de bárbaros átilas;
ou os arautos negros que nos manda a Morte.
São profundas quedas dos Cristos da alma,
de alguma fé adorável que o Destino blasfema.
Esses golpes sangrentos são as crepitações
de algum pão que na porta do forno se queima.
E o homem… Pobre… pobre! Volta os olhos, como
quando por sobre o ombro nos chama uma palmada;
volta os olhos loucos, e todo o vivido
se empoça, como charco de culpa, na mirada.
Há golpes na vida, tão fortes… Eu não sei!
Epístola a los Transeuntes / César Vallejo
Reanudo mi día de conejo
mi noche de elefante en descanso.
Y, entre mi, digo:
ésta es mi inmensidad en bruto, a cántaros
éste es mi grato peso,
que me buscará abajo para pájaro
éste es mi brazo
que por su cuenta rehusó ser ala,
éstas son mis sagradas escrituras,
éstos mis alarmados compañones.
Lúgubre isla me alumbrará continental,
mientras el capitolio se apoye en mi íntimo derrumbe
y la asamblea en lanzas clausure mi desfile.
Pero cuando yo muera
de vida y no de tiempo,
cuando lleguen a dos mis dos maletas,
éste ha de ser mi estómago en que cupo mi lámpara en pedazos,
ésta aquella cabeza que expió los tormentos del círculo en mis pasos,
éstos esos gusanos que el corazón contó por unidades,
éste ha de ser mi cuerpo solidario
por el que vela el alma individual; éste ha de ser
mi hombligo en que maté mis piojos natos,
ésta mi cosa cosa, mi cosa tremebunda.
En tanto, convulsiva, ásperamente
convalece mi freno,
sufriendo como sufro del lenguaje directo del león;
y, puesto que he existido entre dos potestades de ladrillo,
convalesco yo mismo, sonriendo de mis labios.
Epístola aos Transeuntes
Reinicio meu dia de coelho
minha noite de elefante em descanso.
E, entre mim, digo:
esta é minha imensidade em bruto, a cântaros
este é meu grato peso,
que me buscará abaixo para pássaro
este é meu braço
que por sua conta recusou ser asa,
estas são minhas sagradas escrituras,
estes meus alarmados testículos.
Lúgubre ilha me alumbrará continental,
enquanto o capitólio se apoie em meu íntimo desmoronamento
e a assembleia em lanças enclausure meu desfile.
Porém quando eu morra
de vida e não de tempo,
quando cheguem a duas minhas duas maletas,
este há de ser meu estômago em que coube minha lâmpada em pedaços,
esta aquela cabeça que expiou os tormentos do círculo em meus passos,
estes esses vermes que o coração contou por unidades,
este há de ser meu corpo solidário
pelo qual vela a alma individual; este há de ser
meu umbigo onde matei meus piolhos natos,
esta minha coisa coisa, minha coisa horripilante.
No entanto, convulsiva, asperamente e
convalesce meu freio,
sofrendo como sofro da linguagem direta do leão;
e, posto que existi entre duas potestades de obstinação*,
convalesço eu mesmo, sorrindo de meus lábios.
________
NT– Percebi que, em algumas versões ao Português deste poema, o termo ladrillo foi traduzido literalmente por tijolo. Entretanto, o vocábulo tem outras acepções, em Espanhol, como coisa pessada ou aborrecida (quase equivalente a chatice em Português) ou, então, em termo regional peruano, qualidade de pessoa muito trabalhadora e estudiosa. Como não podemos saber, hoje, a exata intenção do poeta ao usar o termo, preferi, quase intuitivamente, utilizar uma idéia mais ligada a sentimentos, pois é disto que trata o poeta em seus versos.
Dijo de los enterradores cosas francamente
impublicables.
Blasfemaba como un condenado
y a sus pies un par de águilas lloraban pensando
en las derrotas.
En el entierro estaba Lautréamont,
yo lo vi desde mi puesto en la cola:
dejaba el sombrero al borde de la tumba
y cantaba algo triste y oscuro
(lloraba honradamente, ya lo creo, y los
caballos devoraban higos en silencio).
Hubo discursos,
sonrisitas de Rimbaud junto a la cruz,
paraguas abiertos a la lluvia como
a él le hubiera gustado.
Hubo más:
hubo viernes y
canciones funerarias,
palomas que volaban sin sentido, como niños,
versos oscuros,
la hermosa voz de Aragón,
suicidios deportivos de Georgette y nunca más
y hasta siempre.
A la hora más triste del asunto
no quería bajar porque decía que allí estaba
oscuro.
Pero estaba muerto y hubo que bajarlo.
Los sombreros abandonaron las cabezas,
se alzaron copas, adioses, letreros de nunca te
olvidamos.
(Un joven poeta a mi derecha le mesaba las
rodillas a la muerte).
Lo bajaron.
Se aplaudió en forma delirante;
la gente corría como loca asumiendo lo grave
del momento.
Lo bajaban.
Las mujeres lloraban en silencio
porque bajaban las águilas, los sueños, países
enteros a la tierra.
Se intentó una última sentencia:
Nerval se acercó con una tiza y escribió con
letra temblorosa: Su cadáver estaba lleno de mundo.
Desde el fondo, Vallejo sonreía sin descanso
pensando en el futuro,
mientras una piedra inmensa le tapaba el
corazón y los papeles.
________ * Poeta cubano (14.11.1944 – 06.07.1985)
O enterro do poeta
A Víctor Casaus
Disse dos coveiros coisas francamente
impublicáveis.
Blasfemava como um condenado
e a seus pés um par de águias choravam pensando nas derrotas.
No enterro estava Lautréamont,
eu o vi desde meu possto na fila:
deixava o chapéu na borda da tumba
e cantava algo triste e obscuro
(chorava honradamente, isso eu creio,
e os cavalos devoravam figos em silêncio).
Houve discursos,
risadinhas de Rimbaud junto à cruz,
guarda-chuvas abertos à chuva como ele teria gostado.
Houve mais:
houve indulgências e canções funerárias,
pombas que voavam sem sentido, como crianças,
versos obscuros,
a formosa voz de Aragón,
suicídios desportivos de Georgette
e nunca mais e até sempre.
Na hora mais triste do assunto
ele não queria baixar porque dizia que ali estava escuro.
Mas estava morto e houve que baixá-lo.
Os chapéus abandonaram as cabeças,
levantaram-se taças, adeuses, faixas de nunca te esquecemos.
(Um jovem poeta à minha direita arrancava os
joelhos da morte.)
O baixaram.
Aplaudiu-se em forma delirante;
as pessoas corriam como loucas, assumindo o grave
do momento.
O baixavam.
As mulheres choravam em silêncio
porque baixavam as águias, os sonhos, países
inteiros à terra.
Tentou-se uma última sentença:
Nerval se proximou com um giz r escreveu com
letra tremida:
Seu cadáver estava pleno de mundo.
Lá no fundo, Vallejo sorria sem descanso
pensando no futuro,
enquanto uma pedra imensa lhe tapava o
coração e os papéis.
Al fin de la batalla,
y muerto ya el combatiente, vino hacia él un hombre
y le dijo: “No mueras, te amo tanto!”
Pero el cadáver ¡ay! siguió muriendo.
Se le acercaron dos y repitiéronle:
“No nos dejes! ¡Valor! ¡Vuelve a la vida!”
Pero el cadáver ¡ay! siguió muriendo.
Acudieron a él veinte, cien, mil, quinientos mil,
clamando: “¡Tanto amor y no poder nada contra la muerte!”
Pero el cadáver ¡ay! siguió muriendo.
Le rodearon millones de individuos,
con un ruego común: “¡Quédate, hermano!”
Pero el cadáver ¡ay! siguió muriendo.
Entonces, todos los hombres de la tierra
le rodearon; les vió el cadáver triste, emocionado;
incorporóse lentamente,
abrazó al primer hombre; echóse a andar…
Massa
Ao fim da batalha,
e morto já o combatente, veio até ele um homem
e lhe disso: “Não morras, amo-te tanto!”
Mas o cadáver, ai, seguiu morrendo.
Acercaram-se-lhe dois e repetiram:
“Não nos deixeis! Ânimo! Volta à vida!”
Mas o cadáver, ai, seguiu morrendo.
Acorreram a ele vinte, cem, mil, quinhentos mil,
clamando: “Tanto amor e não poder nada contra a morte!”
Mas o cadáver, ai, seguiu morrendo.
Rodearam-lhe milhões de indivíduos,
com um rogo comum: “Fica, irmão!”
Mas o cadáver, ai, seguiu morrendo.
Então, todos os homens da terra
o rodearam; viram o cadáver triste, emocionado;
incorporou-se lentamente,
abraçou o primeiro homem; pôs-se a andar…
Vera Lúcia Kalahari, nossa correntista de duas pátrias – Portugal e Angola – faz seu desabafo sobre a atual situação política e econômica de Portugal, em um texto a que chamou Crônica do nosso descontentamento. Quase no epicentro da crise econômica da União Europeia, a pátria lusa compõe, com mais quatro países, o grupo problemático curiosamente chamado de PIGS: Portugal, Itália, Grécia e Espanha (Spain em inglês). O acrônimo foi criado pela imprensa britânica e, por vezes, inclui também a Irlanda. A situação econômica agravou-se nas primeiras semanas de 2010 e criou excessivos níveis de endividamento em alguns países da UE, com reflexos danosos para a saúde do euro, principalmente na Irlanda e da Grécia a Portugal, Espanha e Itália.
Mas há, em Portugal, intensa discussão sobre a situação política e social comandada pelo primeiro ministro e presidente do Partido Socialista, José Sócrates, com retumbância no parlamento português, já que Portugal é um país parlamentarista. Clique aqui e leia a crônica de Vera.
Mulheres sólidas passeiam no jardim molhado de chuva,
o mundo parece que nasceu agora,
mulheres grandes, de coxas largas, de ancas largas,
talhadas para se unirem a homens fortes.
A montanha lavada inaugura toaletes novas
pra namorar o sol, garotos jogam bola.
A baía arfa, esperando repórteres…
Homens distraídos atropelam automóveis,
acácias enfiam chalés pensativos pra dentro das ruas,
meninas de seios estourando esperam o namorado na janela,
estão vestidas só com um blusa, cabelos lustrosos
saídos do banho e pensam longamente na forma
do vestido de noiva: que pena não ter decote!
Arrastarão solenemente a cauda do vestido
até a alcova toda azul, que finura!
A noite grande encherá o espaço
e os corpos decotados se multiplicarão em outros.