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Nilson Monteiro, novo e ilustre correntista

A estréia bancária de Nilson Monteiro

O Banco da Poesia recebe mais um correntista ilustre, que demorou a chegar mas, com certeza, estará sempre por aqui a enriquecer sua conta poética. Orgulho-me por tê-lo como amigo e ter participado de sua formação profissional, como jornalista, no tempo em que ele, um jovem entusiasmado pela área, mostrava o seu talento numa experiência inovadora, o Novo Jornal, por mim editado em Londrina.

Nilson Monteiro nasceu em Presidente Bernardes, no interior de São Paulo, Aportou  em Curitiba ainda aos 10 anos de idade, por força da profissão do pai, que era representante comercial. Um ano e meio depois, por volta de 1964, mudou-se com a família para Londrina, onde se estabeleceu e pôde desenvolver seus estudos, dividindo-se entre os cursos de Letras e Literatura Francesa e Comunicações, na Universidade Estadual de Londrina .

O grande estímulo para ingressar na profissão veio através do jornalista e escritor Domingos Pellegrini, que o levou para o Diário de Londrina, de Edson Maschio, onde, ainda adolescente, foi responsável pela coluna “No Mundo Estudantil”.

Sempre pelas mãos de Pellegrini deu o passo seguinte, que o conduziu à redação do semanário Novo Jornal, ao lado de Marcelo Oikawa, Roldão Arruda e Carlos Eduardo Lourenço Jorge, no início da década de 1970.

O convite para ingressar na Folha de Londrina surgiu na sequência, por intermédio de Walmor Macarini, em 1973. Lá permaneceu por cerca de cinco anos, passando por diversas editorias, com ênfase para a de Cultura. Simultaneamente, desenvolvia trabalhos em rádio e televisão e fazia incursões no terreno da literatura, escrevendo contos e poemas. Passou também por agências de publicidade e ajudou a fundar a Cooperativa de Jornalistas do Paraná, que produzia o jornal Paraná Repórter.

Ainda em meados de 1970 fez parte da redação do lendário Panorama, uma experiência ousada capitaneada pelo empresário e ex-governador Paulo Pimentel, que teve vida breve, porém marcou  história no jornalismo paranaense. Após seu fechamento, Nilson foi para São Paulo, trabalhar no jornal Movimento, o principal porta-voz da esquerda no país à época da ditadura militar. Voltou depois para a Folha de Londrina, onde atuou como repórter especial e editor do Caderno de Cultura, angariando vários prêmios por reportagens que publicou.

Em 1986 transferiu-se para o jornal O Estado de São Paulo, depois para a Gazeta Mercantil, onde editou o Caderno Regional do Paraná e, finalmente, para a revista Isto É.

Nesse meio tempo continuou produzindo poemas e contos. O livro de poemas “Simples” foi editado em 1984. Depois vieram “Curitiba Vista por um Pé Vermelho”, editado pela Fundação Cultural de Curitiba, “Ferroeste, um novo Rumo para o Paraná”, “Itaipu, a Luz”, e, finalmente, “Madeira de Lei”, que narra a trajetória do empresário Miguel Zattar, um pioneiro na área da silvicultura, na condução das Indústrias João José Zattar S/A.

Atualmente lotado no gabinete do governador Beto Richa, Nilson fez assessoria de imprensa no Banco Regional de Desenvolvimento Econômico (BDRE), na Companhia de Habitação do Paraná – Cohapar – e na Associação Comercial do Paraná – ACP. Também assessorou o ex-governador José Richa em sua última campanha para o Senado, na década de 1990.

Seu trabalho recebe, neste momento de sua vida, reconhecimento público, ao ser diplomado como Cidadão Honorário do Paraná, título que receberá no próximo dia 20 de março.

Bem vindo, Nilson poeta, ao nosso Banco. (Cleto de Assis, con informações da Assessoria de Impnresa da Assembléia Legislativa do Paraná)

Impressões de viagem

(crônica a Neruda)

 
Onde andas, poeta, como fantasma
grunhindo as tábuas do convés?

Onde passeias, leve, pipa entre as cores
dos varais e das casas penduradas nas escarpas?

Onde choras, líquido, em meio
às ondas largas e geladas do Pacífico?

Onde, plantas, mágico, teu coração
nas pedras, gelatinas de ostras endurecidas?

Onde, esfarinhas, versejador, tua alma
em estrelas, uvas bêbadas, cafés franceses?

Onde, fincas, amante, as âncoras
na vida, feira livre, de teu povo?

Onde, espalhas, boiadeiro, as crinas
de teus cavalos, relinchos selvagens?

Onde, anjo, sem alas, sem religião,
feito de renda branca da cordilheira,
tateias a pele desses muros?

Aqui, poeta,
aqui entre livros, mapas, bússolas, bananeiras
cerâmicas
e escadas,
as pessoas te chamam neste inferno de paixões
de anjo

Nesta cidade feita de ruelas,
peles, ondas, vinho, fumaça,
bodegas, teias, dores,
empanadas, penhascos que arranham o céu,
choclo e palta nos beiços dos pratos,
pisco e pinga nos copos,
funiculares ensandecidos

Descubro, num átimo, que amo
o atômico explodir da vida,
pedaços de gente esparramados
ao pé do cerro
sortidos em meio ao sebo do porto,
sentimentos espalhados sem cercas

Descubro que amo
cada arrulho de seus colegiais,
meias de lã, gravatas inglesas
achadas no passado,
maritacas de azul
gritando alegrias e mirando futuros
nas rachaduras da arquitetura

Descubro que amo
cada lágrima que desce
nas fendas molhadas da montanha,
vidro, cristal safira que fura os olhos
para embrulhar-se nos lençóis do Pacífico

Descubro que amo
cada suspiro de teu ar,
o cheiro pastoso de teu mercado,
cada célula de teus mariscos,
cada ensaio de voo
de teus copos suados

Descubro que amo
cada farelo de tuas pedras
cada dor de seu paraíso
cada ritmo de teus versos
cada sentimento de entranhas,
das putas e das guitarras,
de ventanas, de pinturas
em paredes sem casca

Onde, poeta, é permitido sonhar
com este prelúdio salgado
desta sinfonia doce que
deram o nome de Neruda?

Aqui,
neste chão agarrado em Valparaíso,
madeira de porão do mar
tua casa de degraus
de mastros eriçados,
La Sebastiana.
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Ilustrações: C. de A.

Cine Teatro Ouro Verde vive a sua maior tragedia

O fogo destrói o Cine Teatro Ouro Verde

A tragédia em dois atos

Se o destino do café é ser torrado, o mesmo não deveria ter ocorrido com o cinema histórico de Londrina que homenageou os bons tempos em que a coffea arabica enriqueceu o Norte do Paraná. O café era, sem dúvida alguma, o ouro verde e não foi por acaso que o moderno cinema projetado pelo arquiteto curitibano João Batista Vilanova Artigas, no final da década de 40 e inaugurado em 1952, recebeu o suntuoso nome: Cine Ouro Verde, que por mais de vinte anos orgulhou a cidade. Era um dos arrojados projetos de Vilanova Artigas, junto ao da Estação Rodoviária, do Fórum e do Edifício Autolon, para os quais ele contou com a parceira do arquiteto Carlos Castaldi.  Já contei, aqui, a história do tombamento da Estação Rodoviária, hoje Museu de Arte de Londrina.  Mas o incêndio que devorou o Cine Teatro Universitário Ouro Verde me chocou, pois também participei do episódio que o salvou, quando ele estava na fase final da venda para uma instituição bancária.

Antiga foto de Londriuna, onde aparecem, à esquerda, o Cine Ouro Verde e, à direita, o Edifício Autolon, projetos de Vilanova Artigas

No final da década de 70 eu trabalhava com Ney Braga no Ministério da Educação. Em uma visita que fiz a Londrina, conversei com Walmor Macarini, então redator-chefe da Folha de Londrina, que me contou sobre a venda do Cine Ouro Verde, propriedade da família de Celso Garcia Cid, de José Garcia Molina, seu sócio na Viação Garcia, de Jordão Santoro e Ângelo Pezarini. O prédio, que não comportava mais a atividade cinematográfica – como ocorreu com a quase totalidade dos cinemas brasileiros, apagados pelas salas de exibição menores dos shopping centers – estava em negociação com um banco, o que significaria o fim do espaço cultural e, possivelmente, a sua derrubada em favor de um edifício mais adequado aos novos negócios. Tanto Walmor quanto eu, evidentemente, nos preocupávamos com o destino do Cine Ouro Verde, um marco da história londrinense e da arquitetura brasileira, inaugurado em 1952, com projeto de  Vilanova Artigas, também autor de outros projetos na cidade, inclusive a estação rodoviária, igualmente inaugurada em 52 e que, já no final da década de 60, se mostrava pequena demais para  a Londrina que se desenvolvera rapidamente.

A fachada do Ouro Verde, que conservou o desenho do projeto original

Outro aspecto da fachada do Ouro Verde (fotos odiraio.com)

Com a preocupação de um final triste para o Cine Ouro Verde, falei com o reitor Oscar Alves, da UEL, e ele telefonou ao ministro Ney Braga, externando também seu desalento com a possível venda do edifício a um grupo privado. Adiantou que eu voltaria a Brasília no dia seguinte e relataria ao ministro os detalhes da situação. No mesmo dia de meu retorno ao MEC, procurei o ministro e expus o problema. Ato contínuo, ele pediu à secretária para localizar um dos proprietários, Manoel Garcia Cid, que logo estava ao telefone. Solicitou ao Neco informações sobre os valores em negociação, além de um prazo para que o poder público pudesse apresentar uma proposta de aquisição do cinema e conservar seu objetivo cultural. Em seguida, fez ele mesmo uma ligação direta para o governador Jaime Canet Jr. e informou-lhe sobre a questão, já com a sugestão de que o MEC entraria com a metade do valor e o governo paranaense com a outra parte, a ser paga em prazo maior.  O governador mostrou-se relutante, em princípio, pois já estávamos em  1978 e ele deixaria o governo em março do ano seguinte. Foi a deixa para que Ney Braga lhe dissesse que, então, estava tudo resolvido, pois ele, como ministro da Educação, daria a primeira metade e a segunda parte seria paga pelo governador Ney Braga, que viria a substituir Canet.

A doação do Cine Ouro Verde à UEL, em 1978: da esquerda para a direita: Francisco Borsari Neto, secretário da Educação e Cultura, Jaime Canet Jr., governador do Paraná, Ney Braga, Oscar Alves, reitor da UEL e Cleto de Assis, diretor de Assuntos Estudantis do MEC – Foto Folha de Londrina

Tudo acertado em menos de uma hora, o processo foi encaminhado para sua resolução legal e, no dia 14 de abril de 78, uma cerimônia no próprio Cine Ouro Verde, com a presença do ministro e do governador, selou a sorte do Cine Ouro Verde, que viria a ser absorvido pela Universidade Estadual de Londrina. Para a adaptação do cinema às novas atividades culturais, consegui do ministro Ney Braga, mais tarde, a aprovação de um projeto de reforma. O Cine Teatro Universitário Ouro Verde foi inaugurado pelo reitor José Carlos Pinotti Filho, que sucedeu a Oscar Alves, e reformado pelo seguinte dirigente, reitor Marco Antonio Fiori. Em 1998, ele foi finalmente tombado pelo Patrimônio Histórico estadual.

Platéia do Cine Teatro Universitário Ouro Verde: tudo transformado em cinzas

Platéia do Cine Teatro Universitário Ouro Verde: tudo transformado em cinzas

E agora? O incêndio do último domingo, dia 12 de fevereiro, causou um grande impacto no Paraná. O governador Beto Richa já anunciou que promoverá a recosntrução daquele espaço cultural. A reitora da UEL, profa. Nádina Aparecida Moreno, também já enfatizou a necessidade da reconstrução, em suas primeiras manifestações à imprensa, logo após o sinistro. Mas a perda foi de todos nós. Um importante local para o desenvolvimento cultural e um poema arquitetônico de Vilanova Artigas, ele  também um patrimônio da cultura paranaense e brasileira.

Eu creio que a tarefa de reerguer das cinzas esta Fênix cultural é obra para todos nós.

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Jão Batista Vilanova Artigas  (1915-1985)

“Admiro os poetas. O que
eles dizem com duas palavras a gente
tem que exprimir com milhares de tijolos.”