Familiares e amigos de Walmor Marcellino participam do lançamento de seu último livro
O jornalista e poeta Walmor Marcellino, falecido em setembro do ano passado, foi homenageado nesta quinta-feira (4/02/2010), na Biblioteca Pública do Paraná, em Curitiba. Familiares e amigos do jornalista se reuniram na data em que ele completaria 80 anos para o lançamento do seu último livro Ulciscor e abertura da exposição de fotos Walmor e Amigos.
O livro foi organizado pela viúva de Marcellino, Elba Ravaglio. “Walmor era uma pessoa incorruptível. Ele estava sempre à margem esquerda, determinado a alcançar um mundo mais justo. Este livro que lançamos hoje é uma obra seqüente de todos escritos que ele já lançou. Ali ele aborda política, sociedade, meios de comunicação. Não há um tema único, mas um conjunto de assuntos que relatam suas experiências e observações sobre o mundo”, explicou o filho do escritor, Marcelo Marcellino.
“Conheci o Walmor nos anos 50, no Diário do Paraná. Havia uma página de arte chamada Letras e Artes, onde os jovens poetas colocavam suas idéias. Ali eu comecei a colocar meus poemas. Walmor me ensinou que poesia não são apenas versos rimados, mas versos livres, como Drummond. Ele foi uma pessoa séria, muito correta. Encarava política como uma missão. Este livro é uma surpresa. Elba finalizou o trabalho, estamos curiosos para saber o seu conteúdo”, destacou o escritor e artista plástico Nelson Padrella.
O poeta Manuel de Andrade contou que voltou a escrever após 30 anos, graças ao incentivo de Walmor Marcellino. “O último escrito que publiquei foi em 1968, ano em que entrou em vigor o AI-5. Walmor foi preso e eu exilado. Eu o reencontrei apenas em 2002. Na época ele me convidou para participar da antologia poética que ele estava organizando, livro que se chamou Próximas Palavras. Voltei a escrever poesia graças a Walmor. Foi uma honra conhecer uma pessoa como ele”, contou Andrade.
“Walmor não era um autor fácil. O processo de consagração deste tipo de escritor é lento, porém inevitável. Ele será consagrado à medida que as pessoas lerem seus trabalhos. É um grande autor, que continuará fazendo história. Seu nome vai continuar vivo”, acentuou o filósofo José Veríssimo Teixeira da Mata, amigo de Walmor.
“Ele era um intelectual multifacetado da literatura, da crônica do cotidiano. Tinha uma palavra firme e desapegada, comprometida com a sua consciência e com a consciência coletiva dos trabalhadores. Um dos maiores intelectuais paranaenses que deve sempre ser relembrado. Fundamentalmente devemos seguir o seu exemplo de coragem”, afirmou o presidente da Ferroeste, Samuel Gomes.
Walmor Marcellino foi casado duas vezes e teve quatro filhos, um deles já falecido. Nascido em Araranguá (SC), em 1930, morou em Florianópolis, Porto Alegre e fixou residência em Curitiba. Escritor com forte atuação política, publicou mais de 30 livros, entre poesia, ficção e textos de opinião.
O jornalista se destacou como ativista de esquerda, participando das lutas pela volta da democracia brasileira nos anos de chumbo do regime militar. Na década de 70, participou do Centro Popular de Cultura em Curitiba e de grupos de teatro da UFPR, sempre em oposição à ditadura militar. Preso político, nunca se furtou da crítica ao governo militar e das suas posições políticas.
Marcellino trabalhou em diversos órgãos de comunicação, entre eles a Gazeta do Povo e o jornal Última Hora, e também na Assembleia Legislativa do Paraná e no Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE).
Além de jornalista, poeta, e dramaturgo, Walmor Marcelino também era compositor. Junto com o músico Gerson Biantinez, compôs O Encontro de Walmor Marcellino com o Capitão Lamarca. A música, inédita, fala do encontro do jornalista com o guerrilheiro. (Agência Estadual de Notícias, fotos Levy Ferreira)
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Ao amigo Walmor
Manoel de Andrade
Estive quinta feira, dia 04, na merecida homenagem aos 80 anos de Walmor Marcelino e lançamento de seu livro Ulciscor. O evento foi aberto com as palavras do nosso querido Cláudio Fajardo, diretor da Biblioteca Pública do Paraná, saudando, com sua invejável linguagem, o amigo de muitas trincheiras e abordando a obra literária e o pensamento político do Walmor.
Muita gente, canais de TV filmando e um programa onde amigos leram alguns de seus poemas e escritos políticos intercalados com trechos de uma de suas entrevistas, exibida em data-show num telão ao fundo. Jornalistas, políticos, poetas, atores, muitos dos seus velhos camaradas do Partido Comunista, admiradores e leitores dos seus mais de 30 livros. Li o seu poema As Mães da Praça de Maio e, em nome do João Bosco Vidal — que o conheceu depois da anistia —, o seu poema Culpa. No final da primeira parte foi interpretada a canção lembrando o encontro de Walmor com o guerrilheiro Carlos Lamarca, com letra do próprio poeta e música e interpretação de Genson Biantinez. O evento foi encerrado com meu preito de gratidão ao Walmor que, em 2002, marcou meu reencontro com a poesia depois de 30 anos de abstinência literária ao incluir meus poemas na antologia Próximas Palavras, e me estimulando a voltar a escrever.
Posteriormente foi inaugurada, no saguão do auditório, a sua imagem em mosaico feita pelo artista equatoriano Javier Guerrero, num comovente tributo de Cláudio Fajardo ao amigo e ao velho companheiro de lutas nos “anos de chumbo” da ditadura militar.
Conheci o Walmor na década de 60. Éramos uma meia dúzia de “ratos” de livraria da Ghignone, naquele saudoso tempo em ela ainda abria suas portas na rua XV de Novembro.Ali, no final das tardes, chegava o livreiro Aristides Vinholes, o poeta e crítico literário Sérgio Rubens Sossella, o publicitário e romancista Jamil Snege, o poeta e contista Nelson Padrella, o grande polemista Walmor Marcelino e eu, que estreava naqueles anos na poesia. Mas toda aquela memorável agenda vespertina se fechou para sempre depois que a Ditadura lançou o AI-5, em 13 de dezembro de 68, e muitos de nós passamos a respirar numa atmosfera de medo e de pressentimentos. O marxista Vinholes sumiu, o Walmor foi preso e eu fugi para a América Latina. Eu só encontraria o Walmor no século seguinte.