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Ademir Demarchi e o elogio a Tânatos

Ademir Demarchi nasceu em Maringá, em 7 de abril de 1960, e reside em Santos há 15 anos, onde trabalha como redator. Formado em Letras/Francês, com Mestrado pela Universidade Federal de Santa Catarina (1991) e Doutorado em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo (1997), foi editor da revista Babel, de poesia, crítica e tradução, com seis números publicados de 2000 a 2004. É autor de Passagens – Antologia de Poetas Contemporâneos do Paraná (Imprensa Oficial do PR, 2002); Volúpias (poemas, Florianópolis: Editora Semprelo, 1990); Espelhos incessantes (“livro de artista” com poemas do autor e gravuras de Denise Helena Corá, edição dos autores, Santos: 1993; exposto no Museu da Gravura em Curitiba no mesmo ano); Janelas para lugar nenhum (poemas, com linoleogravuras de Edgar Cliquet, edição dos autores, Santos: 1993; lançamento feito em Curitiba, no Museu da Gravura, no mesmo ano). Além desses trabalhos, o autor tem também poemas, artigos e ensaios publicados nos livros Passagens – Antologia de Poetas Contemporâneos do Paraná; 18 Poetas CatarinensesA mais nova geração deles (ed. e org. Fábio Brüggemann, FCC Edições/Editora Semprelo, 1991); Os mortos na sala de jantar (Realejo Livros, 2007) e Passeios na Floresta (Editora Éblis, Porto Alegre, 2008). Publica também em periódicos como Literatura e Sociedade (São Paulo, USP); Medusa (Curitiba); Coyote (São Paulo), Oroboro (Curitiba),  Jornal do Brasil/Idéias; Rascunho (Curitiba); Jornal da Biblioteca Pública do Paraná; Babel (Santos); Sebastião (São Paulo); Los Rollos del Mar Muerto (Buenos Aires, Argentina) e sites,  entre eles,  as revistas eletrônicas Germina, Agulha, El Artefacto Literario, Tanto e Critério.

Em seu livro Os Mortos na Sala de Jantar, Ademir Demarchi invade o terreno quase proibido — ou pelo menos evitado — da Morte, essa senhora que nos espera desde o dia em que nascemos. Não é tema inédito nas artes, mas é sempre corajoso, dado o costume que temos defugir do tema. Talvez, em nossa literatura pátria, o exemplo máximo de culto à morte tenha sido o de Augusto dos Anjos (1884-1914), poeta que feria sua obra com a obsessão pelo sofrimento, produto de sua frágil saúde e senilidade precoce. Demarchi, no entanto, não se refugia em sentimentos negativos pessoais. Apenas nos lança um desafio — olhar de frente o único acontecimento previsível de nossa própria vida e do qual quase sempre nos recusamos até mesmo de falar.  E já no começo de seu livro, registra a simples e inequívoca frase lapidar de Marcel Duchamp (1887-1968), o polêmico dadaísta francês: “…além disso, é sempre os outros que morrem…“.

Mas avisa aos desavisados, no seu primeiro registro poético:

As aparências enganam

qualquer semelhança
com palavras fatos
coisas pessoas

mortos

terá sido mera coincidência

Ademir dedica seu livro “aos cadáveres que a vida no dá de comer”, o que explica o título Os Mortos na Sala de Jantar. Em um de seus poemas, ironicamente nos faz pensar na atualíssima ração humana (“seja lá o que isso for“), para ampliar o cardápio do excêntrico (ou muito centrado) ágape poético. E pesponta o livro com momentos de irônico humor: “lá vai o viúvo / sorri sua mulher / morreu sua amante” (Da Felicidade e da Infelicidade) e satirizando a Política em Manchete: “ex-diretor de cemitério / nega ter sido / funcionário fantasma“.

Quem tem medo do escuro, leia. Quem não gosta nem de ouvir falar na Morte, leia também. O livro de Ademir Demarchi faz a gente pensar por meio da composição poética, que estende as mínimas palavras em máximas reflexões. Como no seu mais lacônico poema, quase posfácio, Pós Tudo: ¨pó”. É preciso mais para filosofarmos sobre nosso destino? (C. de A.)

Da Incapacidade de Sentir Luto


amas parasita, diz e diz, não exita:
o amor, errante, além de tudo cego
feito um imenso morcego negro
que, imerso em trevas, só vê o ego

ouves senão por apupos meigos
inflação econômica de si mesmo
insuflada por espelhos vesgos
e promessas de paraísos ternos

no vazio de si inflas de ilusão
e epifania um Pai de aluvião
que cadencie carnificina e gozo

o ego cego que tem por coração
blindado e oco veloz do ai se esvazia

veloz esqueces crimes e imune à punição
desobrigas-te de tudo
e até do luto

Balada de Narayama

Imagem do cartaz do filme Balada de Narayama, de Keisuke Kinoshita (1958)

a sina assinala a hora
para o filho chegada
para a mãe partida

ossos pelo caminho
assinalam as vorazes fomes
dos que deles nasceram
e se nutriram para tomar forma
perpetuando a vinha

o útero que o fiou
agora às costas
é uma pena inútil
pela qual não se chora

subindo a montanha
reprimes a vida de manhas
para ser pai deixarás
a mãe às entranhas

Enterros no Céu


não há terra para o enterro
nem parasitas para roer
há frio que congela os corpos
e não os desintegra

é preciso fazê-Ias desaparecer

por não ter onde os pôr
os tibetanos os levam a uma alta pedra
e os repicam em pedaços
que as aves de rapina
possam bicar

e

levar

para

o

céu

Um trovador do Norte do Paraná

O poeta José Marins distribuiu algumas folhas de trovas de Antonio Augusto de Assis, de Maringá. Gostei e solicitei ao Marins que ampliasse as informações sobre o poeta dos três A, para publicação no Banco da Poesia. Pedido rápido e resposta idem. E eis um novo depositante de nosso Banco, que mostra não só uma pequena coleção de quadras, mas também poemínimos e um lírico soneto.

Bem vindo seja, augusto Antonio e, ainda por cima, de Assis. E mil agradecimentos ao José Marins, pela colaboração.

aaassisAntonio Agusto de Assis é poeta e trovador. Nasceu em São Fidélis, Rio de Janeiro,
no dia 07 de abril de 1933. Hoje aposentado, foi professor do Departamento de Letras
da Universidade Estadual de Maringá e reside naquela cidade do Norte do Paraná.
Integra a Academia de Letras de Maringá e a União Brasileira de Trovadores (seção
de Maringá).Editor do boletim Trovia, da UBT – Maringá e do jornal  Trovamar, da UBT – Balneário Camboriú.

Publicações do autor: Robson; Itinerário; Coleção Cadernos de A. A. de Assis – 10 volumes; O português nosso de cada dia; Poêmica; Caderno de trovas; Autor dos versos da “Missa em trovas”.

Livros disponíveis na Internet (e-books) Tábua de Trovas; Trovas Brincantes; Cem trovas no Cen (Cá Entre Nós), antologia de vários autores; 60 Trovas de Amor, antologia; 60 Trovas de Humor, antologia; 60 Trovas de Saudade e Triversos.

Por um beijo

Beijos

Por um beijo eu lhe dou o que sou e o que tenho:
os bons sonhos que sonho, as plantinhas que planto,
a pureza, a alegria, as cantigas que eu canto,
e o meu verso se acaso houver nele arte e engenho.

Por um beijo eu lhe dou, se preciso, o meu pranto,
as angústias da luta em que há tanto me empenho,
as saudades que trago do chão de onde venho,
as promessas que eu faço, piedoso, ao meu santo.

Por um beijo eu lhe dou meus anseios de paz,
minha fé na ternura e no bem que ela faz,
meu apego à esperança, que insisto em manter.

Por um beijo, um só beijo, um momento de amor,
eu lhe dou meu sorriso, eu lhe dou minha dor,
o meu todo eu lhe dou, dou-lhe inteiro o meu ser!

Poeminhas (à moda de haicais)

Florzinha caipira.
Até o girassol, tão nobre,
ao vê-la suspira.

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Um pingo… dois pingos…
não parou mais de pingar.
E se fez o mar.

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Sempre assim supus.
Pirilampo ou vaga-lume,
tanto faz: é luz.

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Trenzinho da serra…
Pa… Pa-ra-ná… Pa-ra-ná…
pra Paranaguá.

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Releio Pessoa.
Finjo tão completamente,
que a tristeza voa.

A. A. de Assis é o trovador mais premiado do Brasil, em certames nacionais, estaduais e internacionais.

Moderno, poupa viagem
o novo pombo correio:
– Hoje ele manda a mensagem
numa boa, por e-mail…

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De dia caleja a palma
o irmão que cultiva o chão;
de noite alivia a alma
nas cordas de um violão!

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Num tempo em que tantas guerras
enchem o mundo de terror
benditos os que na terra
semeiam versos de amor.