Solivan Brugnara
Quero ver
mar, estrelas, nebulosas,
qualquer imensidão.
Pastorear êxodos.
Cavalgar manadas.
Beber oceanos.
Quero ver
mar, estrelas, nebulosas,
qualquer imensidão.
Pastorear êxodos.
Cavalgar manadas.
Beber oceanos.
Salut Navarro Girbés, Valencia, España
En la abstración de mi pensamiento
te encuentro absorto en tu esencia,
araño las albas no vividas
agotadas ya em nuestras quimeras.
Un canto extrañamente seductor
me convierte en ave blanca
para llegar a tu puerto y besar
las alas que te permiten volar.
La tristeza me cubre y me descalza.
mi soledad bate em tu corazón
trazando arco Iris en la hierba negra,
y adviertiendo que mi destino es el mar.
Na abstração de meu pensamento
te encontro absorto em tu essencia,
arranho as albas não vividas
esgotadas já em nossas quimeras.
Um canto estranhamente sedutor
me converte em ave branca
para chegar a teu porto e beijar
as asas que te permitem voar.
A tristeza me cobre e me descalça.
minha solidão bate em teu coração
traçando arco-íris na erva negra,
e advertindo que meu destino é o mar.
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Versão em Português e ilustração: C. de A.
Publicado em Poemas
Com a tag ave blanca, ave branca, Espanha, intuição, intuición, mar, Salut Navarro Girbés, Valência
Manoel de Andrade, com bigodes zapatianos, moldura de sua juventude, passeia nas recordações marítimas
A praia quase deserta
a manhã despertando na luz dos elementos
o céu e o mar buscando os seus azuis
as águas que se iluminam lentamente
o vôo preguiçoso das gaivotas
a serenidade de uma vela na distância
as ondas que se quebram mansamente
o enigma dessa paz que só o mar nos concede.
Meus olhos perscrutam o impossível
na invisível beleza marítima da vida.
Minha alma penetra no âmago majestoso da paisagem
e viaja longamente pelo instante mágico do tempo.
Mar, imenso mar
meu olhar flutua na imobilidade do teu corpo iluminado
nestas canoas batidas pela luz ao largo da baía
nestes pescadores curtidos pelo sol e pelo azul
a recolher, de longe em longe, seus frutos de escamas coloridas.
Beijo-te na salgada madeira destes barcos recolhidos,
te abraço no velho homem remendando sua rede.
Caminho neste estuante cenário de água e areia
recordo-me menino neste banquete de espumas flutuantes
na frescura das ondas que morrem aos meus pés
mergulho no teu ritmo
e danço contigo no encanto desta valsa milenar.
Atlântico, meu Atlântico
águas que não conheço nas distâncias do horizonte
esse mar visto apenas das areias
da foz exuberante das correntes
da barra destes rios que tu acolhes
águas fundas, águas rasas
águas doces que cruzei.
Recortados litorais do sul
meu norte
minha praia
meu idioma açoriano
meu salgado fruto
minha fritura, meu peixe, meu pirão
roteiro prematuro dos meus passos
itinerário incansável em meus pés descalços
íntimos recantos de baías e enseadas
antigo esconderijo dos corsários
história nas estórias de velhos habitantes.
Mar, imenso mar
planície total e palpitante
miragem e sedução
misteriosa superfície nos caminhos do destino
o mar de todas as proas
esse território dos meus sonhos.
Navegar, não naveguei…
as águas do Titicaca foram minha gota de oceano no alto da Cordilheira.
Navegar, como quisera navegar, nunca naveguei…
Rota costeira de Quayaquil a Callao,
minha única travessia
meu mar sem horizontes
minha comovida migalha de aventura.
Ao rouxinol que canta
Na noite que vai caindo
Marcado de triste dor,
Às nuvens que vão subindo
Em matizes d’esplendor,
Eu peço notícias de ti.
Ao vento que vai passando
À brisa que vem chegando,
Ao odor do mar e da flor,
Ao canto das praias varridas
Pelas ondas irritadas,
Eu peço notícias de ti.
Às gaivotas que vão deixando
Pelo ar, um risco branco,
Ao rumor leve dos búzios,
Às mil e uma coisas da terra,
Eu peço notícias de ti.
Aos homens que vem chegando,
Aos barcos, às fontes, aos rios,
Às estrelas que vão brilhando
Em risos, em frio desdém,
Eu peço notícias de ti.
Ninguém mas dá…
Só a chuva, sobre mim em pranto se cerra…
Há silêncio em toda a terra
Silêncio seco e ruim
De ventos vergando ramos
Como se dentro de mim
O mesmo silêncio se vaze.
Não há notícias de ti…
E neste anseio cansado
Nesta pergunta tão vã,
Apenas queria, vê lá,
Ser nuvem, ser ave, ter asas,
Ter algo mais do que sonhos,
Do que cantos, do que versos,
P’ra que pudesse voar
E poder assim saber,
Algo de ti, meu amor.
Vera Lúcia
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xxxxxLá vai a Dona Biloca levando uma corvina…
xxxxxLevei uma surra porque peguei um ovo no galinheiro dela
xxxxxe disse pra minha mãe que achei na rua…
xxxxxLá vem a Odair e o Udinho…
xxxxxEu sei que eles querem brincar na piscina que eu fiz sooozinho…
xxxxx─ Ei Lelo, lá vem o Seu Badico lavar os cavalos na praia…
xxxxx—Eu sei, mas depois ele vai encher a carroça de tainhas,
xxxxxvai pôr folhas de bananeira em cima e vai vender lá em Medeiros.
xxxxx─ Paaaai!… deixa eu ir com o senhor lá em Medeiros???
xxxxxComo eu gosto de lavar o Sanho… ele é tão mansinho…
xxxxx─ Pai… o senhor já nadou até a ilha?
xxxxx─ Pai… depois o senhor me leva até o fundo?
xxxxx─ Pai… eles vão pôr de novo a rede hoje?
xxxxx─ Pai… depois vamos tomar garapa lá no Seu Bebé?
Infância… a indelével imagem da vida
o território mágico da alma
lembrança viva e peregrina que flutua pelo tempo.
Ah! Essa salgada saudade dos braços fortes de meu pai
a levar-me sobre os ombros entre as ondas.
O salto, o mergulho, o torvelinho das águas
minha festa, meu delírio.
Meu mar, meu céu, meu pão de liberdade
meus sete anos correndo atrás das gaivotas
perambulando entre as canoas que chegavam
meus pés vestidos com pantufas de espuma
a chutar seus densos flocos pelo ar.
As estrelas-do-mar semeadas ao longo dos meus passos
os siris entrando em seus buracos
os maçaricos andando ligeirinhos pela praia
as redes chegando lentamente com o cardume aprisionado
arraias, bagres, cações
espadas, águas-vivas, caranguejos
os pescadores repartindo os peixes agonizantes
os baiacus mortos na areia
os restos do arrastão espalhados sobre a praia
meu samburá repleto de peixinhos.
Ah, a canção intermitente das ondas
o poético itinerário das velas levadas pelo vento
o vôo vagabundo das aves litorâneas
o dorso escuro dos botos surgindo de quando em quando sobre as águas.
A maré alta da tarde apagando as marcas da manhã
a minha lagoinha lá perto da ponte
o meu mangue povoado de siris-goiá
meu pai tirando ostras
o rio desembocando lá na barra
a chegada das tainhas no inverno.
Ali morava minha infância
ali, e na imensurável morada do horizonte…
Meus olhos despertavam nas pálpebras entreabertas da aurora
e partiam com os mastros que sumiam na distância.
Vagavam no caminho melancólico do crepúsculo
no ocaso das tardes e na penumbra
na sedução da lua cheia sobre o mar.
Ah, Piçarras!… Piçarras!………………………
Não eras ainda esse moderno balneário
e a tua praia era somente minha o ano inteiro.
………………………………………………………………………………………………………………….
xxxxxAs velas da minha infância,
xxxxxarriadas pelo tempo, já não saem pra pescar.
xxxxxAs redes daqueles anos,
xxxxxabertas qual flor nas águas, chegam vazias do mar.
xxxxxOs cardumes de tainhas,
xxxxxligeiras como corisco, já não chegam pra invernar.
xxxxxAs águas vivas do rio,
xxxxxhoje carregam chorando, seu veneno para o mar.
xxxxxMeu manguezal de menino,
xxxxxberçário de tantas vidas, foi inteiro loteado.
xxxxxMinhas canoas à vela,
xxxxxpoemas soltos ao vento, hoje navegam roncando.
xxxxxO lago era um ovário
xxxxxcujo canal dava ao rio, e tudo foi aterrado.
xxxxxProgresso… que desencanto!!!
xxxxxsou um estranho nesse ninho, sou uma infância chorando.
………………………………………………………………………………………………………………….
Ó mar, ó mar
procuro em vão meus rastros na areia
e por isso meus passos já não serão como um regresso…
Me restará, contudo, sempre a tua eterna imagem,
tua beleza amanhecida e retocada pelo sol e pela brisa,
tuas verdes planícies que espraiam o mundo.
Resta-me o teu sabor primordial
“o sal da vida”
linfa incorruptível
ventre profundo que dia a dia reinaugura a maternidade planetária.
Restam-me tuas noites pontilhadas pelos faróis do mundo
por Sírius, Antares, Aldebarã…
por todo o firmamento constelado
e pelo esplendor dos plenilúnios.
Volto, saudoso, a meus mares
porque sempre haverá um leste e um sul magnético no meu peito
apontando-me o encanto desses íntimos recantos.
Aqui, uma pequenina praia entre pedras e penhascos,
ali, a visão imensa da baía com seus barcos e canoas,
além, o grito alado das plumagens que voam lentamente sobre as ondas
ao longe, o pesqueiro solitário que demanda as águas fundas.
Relembro este molhe de pedra que avança sobre o mar
do farol da barra e desta paisagem soberana
e da minha adolescência, cruzando a nado esta corrente.
É o meu Itajaí-Açu desembocando calmamente no oceano
neste mar tão verde desta manhã de sol.
Meu olhar ancora ao longe, nos navios fundeados
e navega, mais além, pousado no mastro esbelto de um veleiro.
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Mar, ó mar
restará sempre o teu murmúrio a embalar o mundo
a voz inaudível das profundidades orientando a rota dos cardumes
a tua gestação incessante de criaturas
a força imponderável das correntes
a pontualidade das marés
os teus ciclos arquétipos que sustentam a vida.
Mar, ó mar
basta-me hoje o que já me deste desde sempre…
a tua imensidão tatuada nos meus olhos,
verde enseada onde aportou meu lírico destino.
Esses teus encantos, as tuas extensões, essa totalidade…
todas as tuas medidas eu quisera ter na suprema síntese dos meus versos,
para dá-la ao mundo na expressão mais bela da poesia:
a face deslumbrante da esperança.
xxxxxxxxxxxxxxxxPiçarras – Itajaí, fevereiro de 2005.
Publicado em Poemas
Com a tag canoas, infância, Itajaí-Açu, manguezal, Manoel de Andrade, mar, meus mares, pescadores, Piçarras, plenilúnios, sal da vida, taiunhas
O poeta Armenio Vieira, de Cabo Verde, ganhou o Prêmio Camões, o mais importante prêmio literário da língua portuguesa, informou na quarta-feira, dia 3/6, a imprensa portuguesa. É a primeira vez que este prêmio é atribuído a um cidadão de Cabo Verde, “país cuja tradição literária e cultural merece um reconhecimento”, segundo a presidente do júri Helena Buescu.
Nascido em 2 de janeiro de 1941, Vieira é jornalista e colabora com diversas publicações. Seu primeiro livro, intitulado Poemas foi publicado em 1981. O Prêmio Camões, dotado de 100 mil euros, foi criado em 1988 por Portugal e Brasil com o objetivo de recompensar os autores de língua portuguesa que contribuem para enriquecer o patrimônio cultural e literário dos países lusófonos. Autores como os portugueses Antonio Lobo Antunes (em 2007) e José Saramago (em 1995), o brasileiro Jorge Amado (em 1994) e o angolano Pepetela (em 1997) foram alguns dos vencedores em edições anteriores. (Agência France Presse)
O Banco da Poesia também presta homenagem ao recente laureado, com três poemas de sua lavra. Ao final, a homenagem a Cabo Verde, que também apareceu por aqui no dia 31 de maio, com Corsino Fortes. No vídeo, canta uma das maiores intérpretes cabo-verdianas, Cesária Évora, em crioulo, que é uma mistura do português arcaico com a lingua nativa. E quem a acompanha é a nossa Marisa Monte. Segundo a Wikipédia, Cesária Évora (Mindelo, 27 de agosto de 1941), também conhecida como “a diva dos pés descalços”, é a cantora cabo-verdiana de maior reconhecimento internacional de toda história da música popular daquele país. O gênero musical com o qual ela é melhor relacionada é a “morna”, por isso também recebe o apelido de “Rainha da morna”, mesmo tendo sido bastante sucedida com diversos outros gêneros musicais. Morna é um ritmo e uma dança de Cabo-Verde, que lembra o nosso samba e, às vezes, o chorinho.
xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxIsto!
E perguntam-nos:
xxxxxxxxxxxxxxx– sois homens?
Respondemos:
xxxxxxxxxxxxxxx– animais de capoeira.
Dizem-nos:
xxxxxxxxxxxxxxx– bom dia.
Pensamos:
xxxxxxxxxxxxxxxlá fora…
Isto é que fazem de nós
quando nos inquirem:
xxxxxxxxxxxxxxx– estais vivos?
E em nós
as galinhas respondem:
xxxxxxxxxxxxxxx–dormimos.
Mar! Mar!
Mar! Mar!
Quem sentiu mar?
Não o mar azul
de caravelas ao largo
e marinheiros valentes
Não o mar de todos os ruídos
de ondas
que estalam na praia
Não o mar salgado
dos pássaros marinhos
de conchas
areias
e algas do mar
Mar!
Raiva-angústia
de revolta contida
Mar!
Siléncio-espuma
de lábios sangrados
e dentes partidos
Mar!
do não-repartido
e do sonho afrontado
Mar!
Quem sentiu mar?
xxxxxxxxxxxxxxx(1962)O tigre ignora a liberdade do salto
é como se uma mola o compelisse a pular.
Entre o cio e a cópula
o tigre não ama.
Ele busca a fêmea
como quem procura comida.
Sem tempo na alma,
é no presente que o tigre existe.
Nenhuma voz lhe fala da morte.
O tigre, já velho, dorme e passa.
Ele é esquivo,
não há mãos que o tomem.
Não soa,
porque não respira.
É menos que embrião
abaixo do ovo,
infra-sémen.
Não tem forma,
é quase nada, parece morto.
Porém existe,
por isso espera.
Epopéia, canção de amor,
epigrama, ode moderna, epitáfio,
Ele será
quando for tempo disso.
xxxxxO… Mar, detá quitinho bô dixam bai
xxxxxBô dixam bai spiá nha terra
xxxxxBô dixam bai salvá nha Mâe… Oh Mar, oh mar
xxxxxMar azul, subi mansinho
xxxxxLua cheia lumiam caminho
xxxxxPam ba nha terra di meu
xxxxxSão Vicente pequinino, pam bà braçá nha cretcheu…
xxxxxOh… Mar, anô passá tempo corrê
xxxxxSol raiá, lua sai
xxxxxA mi ausente na terra longe… Oh Mar, oh Mar..
Com a tag Antonio Lobo Antunes, Armenio Vieira, Cabo Verde, Cesária Évora, galinhas, Jorge Amado, José Saramago, mar, Marisa Monte, morna, Prêmio Camões, tigre