Batom vermeio
……….— Me dá um cigarro aí, dona.
……….Gelei. Merda… Merda não. Mijo. Senti um forte cheiro de mijo e a ponta de uma faca nas minhas costas. Maldita lei anti-fumo. Ter que fumar aqui fora à uma hora dessas…
……….Traguei profundamente a fumaça do cigarro recém acendido, me virei devagar e dei de cara com meu assaltante madrugueiro.
……….— Passa o cigarro e o dinheiro.
……….Dei mais uma tragada no cigarro e entreguei a ele.
……….— Esse?
……….— Só tenho esse. É o último. É pegá ou largá.
……….Pegou, olhou curioso, girou entre os dedos.
……….— Mas, tá sujo de batom.
……….— To falando que é o último. Se não quer, me devolva! To louca pra fumar e você ta me roubando o último cigarro que tenho.
……….Fiz menção de pegar de volta. Afastou-se na defensiva com a faca apontada.
……….— Que muiezinha braba! Nunca uma dona dividiu o último cigarro comigo… Ainda mais sujo de batom vermeio.
……….Como se eu não existisse, começou a brincar com o cigarro passando de uma mão para outra, intercalando com a faca. Cheirava o filtro, levava à boca, lambia o batom, tragava delicadamente, admirava a fumaça e beijava o cigarro como se fosse um presente, um fetiche.
……….Andou alguns passos adiante, parou, virou-se, me olhou demoradamente e me apontou com a faca novamente.
……….— Vai ficá prantada aí, dona?
……….— Não…
……….— Então entra, muié. É pirigoso ficá aqui fora sozinha.
……….E foi andando, dançando como Chaplin, cantando assim: Batom vermeio, vermeínho… ganhei um cigarrinho tudo sujo de batom vermeio, vermeínho…
_____________________