Hélio Fileno de Freitas Puglielli, Professor da UFPR (1971/96), da PUCPR (1967/78) e ex-editorialista dos jornais curitibanos O Estado do Paraná, Indústria & Comércio e Gazeta do Povo. Como poeta, oferece uma contribuição destinada a merecer os mais profundos estudos pela dimensão da proposta, no que contém de síntese-filosofia em palavras das mais trabalhadas em O Ser de Parmênides chama-se Brahma, livro de apenas 18 páginas. Hélio faz uma espécie de projeto literário, coincidentemente, em outro livro (Para Compreender o Paraná, 86 páginas, Secretaria da Cultura do Paraná), onde dá sua contribuição de crítico, com a visão de jornalista que nunca abandonou a profissão. Ao deixar o compromisso diário com o jornal, não deixou, porém, de escrever. Selecionou 93 textos curtos em sua forma, mas profundos em seu conteúdo – nos quais analisa desde o linguajar paranaense, como faz perfis de personalidades como Bento Munhoz, David Carneiro, Erasmo Pilotto, Ernani Reichman, Sérgio Sossella, Emiliano Perneta, Wilson Martins, Paulo Leminski, Plácido e Silva, Colombo de Souza, Samuel Guimarães da Costa, entre outros. Despretenciosamente, Para Compreender o Paraná, é um dos mais importantes volumes já editados, pois, numa forma rápida, simples e jornalística, mostra “Bichos do Paraná” que merecem – e devem – ser melhor estudados e, logicamente, admirados.
As informações acima, condensadas (e atualizadas) de um texto maior escrito há tempos por Aramis Millarch, são apenas breves pinceladas da figura do respeitado jornalista e poeta, que manda seu primeiro depósito ao Banco da Poesia. Um poema de certa forma provinciano, por se referir a personagens de um estrito cenário cultural curitibano – que nossa geração conheceu muito bem – mas universal por tratar carinhosamente da lembrança de amigos queridos e da eterna perplexidade humana diante da ineludível viagem.
Bem vindo, Hélio! A casa é sua.
Pelos amigos mortos
ou
Guinsky, nós nos lembramos
Os anjos do poeta Colombo de Souza
estão lavando as nuvens no céu,
enquanto pelos caminhos da infância
foge a raposa azul de Armando Ribeiro Pinto.
Wilson Rodrigues Cordeiro sorri de soslaio
e só o Guinsky se lembra dele,
embora não consiga desenhar
a camisa azul e o terno cinza
ectoplasmáticos.
E muito menos será possível fixar
a cor do sorriso, flor do enfisema mortal.
Guinsky, Guinsky, onde se perdeu a chave
que abria fechaduras na testa de seus fantasmas?
Aqueles pontos de interrogaçâo que você semeava
atravessaram a ponte das lembranças.
(Sobre a superfície das águas
nem mais flutua o espírito de Deus.)
Por que era tão encabulado o poeta
Cristóvão Colombo de Souza?
Por que Armando amou o cinema tanto
e não arrancou das telas para a vida
sequer um hollywoodiano happy end?
Por que Wilson Cordeiro fumava tanto,
rivalizando com o juiz Sérgio Rubens Sossela?
Deste, milhares de poesias curtas vagam pelo espaço.
São petardos, ainda quentes das horas de insônia e desespero.
O famigerado juiz-rabo-de-cavalo,
agora sem Corregedor pra aporrinhar,
acelera a moto na mais sensata corrida de sua morte.
Jamil Snege, na esquina, dá aquela risada safada,
ele que fumou até a hora de morrer,
fino artesão de palavras,
olhar brilhante apagado,
cinzas de cigarro.
O caboclo Cardoso
há muito tempo se foi.
Está em Morretes, incógnito,
na gerência de bar invisível.
Por que, Guinsky, não há como desenhar
as inaudíveis rabecas?
Também se foi César Bond,
aquele dos “homens tão chapéus”,
mas Curitiba não sabe.
Curitiba global.
Valêncio calou a voz de falsete,
descalçou os sapatos de lona,
pé ante pé, procurando
infinitas vanguardas.
Walmor Marcelino acaba de partir,
com muxoxos de desdém,
intransigente sempre,
coerente sempre,
exceção à regra.
Quem vai gravar o sotaque catarina,
a figura quixotesca
com lances de prosápia e de rancor?
(Preferível tê-lo pouco amigo e debochado
a ter dez amigos desfibrados.)
Toda essa gente está nas estrelas, Guinsky.
mas, é claro, não dá pra ver
neste porra céu fosco de Curitiba.
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