Um poeta português de hoje, a mim aprsentado por meu amigo João Defreitas: Joaquim Pessoa. Ele nasceu em Barreiro (na foz do Tejo, em frente a Lisboa) em 1948. Iniciou a sua carreira no Suplemento Literário Juvenil do Diário de Lisboa. Seu primeiro livro foi editado em 1975 e, até hoje, publicou mais de vinte obras incluindo duas antologias. Foram lhe atribuídos os prêmios literários da Associação Portuguesa de Escritores e da Secretaria de Estado da Cultura (Prêmio de Poesia de 1981), o Prêmio de Literatura António Nobre e o Prêmio Cidade de Almada. Poeta, publicitário e pintor, é uma das vozes mais destacadas da poesia portuguesa do pós 25 de Abril, sendo considerado um “renovador” nesta área. O amor e a denúncia social são uma constante nas suas obras e, segundo David Mourão Ferreira, é um dos atuais poetas progressistas naturalmente de capazes de comunicar com um grande público.Para os leitores do Banco da Poesia, três poemas do novo Pessoa português.
O Cão da Tristeza
O cão da tristeza está aqui.
Aqui, sem alma, ferrado no meu espanto.
Puxando as verdes charruas do meu pranto
lavrando a dor cinzenta do meu povo.
O cão da tristeza está aqui.
No giz do meu lume, na fogueira acesa
que queima a minha casa, destrói a minha mesa
e magoa o meu sangue e a minha voz.
o cão da tristeza está aqui.
No açaime do medo que nos cala
na sombra do punhal, no frio da bala
apontada ao coração da nossa esperança.
Canção de estar em terra
Da sede meu amor farei um barco.
Uma vela no porto. E ao vê-la perto
eu direi meu amor que por ti parto
e fico e firo e faço e sigo e ardo.
Direi a rosa o cravo o trevo o cardo.
Darei o corpo, amor. Direi um astro.
Ai flor de quem está farto farto farto
de rimar contra a maré em pinho incerto.
Que mais direi amor? Eu que maldigo
eu que mal amo as coisas conquistadas
que mais direi? Anéis corais espadas?
Já mal me há-de bastar o que eu não digo.
É aqui, de bruços sobre a espuma
que o mar nos causa a dor de estar em terra.
E as palavras nos doem uma a uma.
E os homens em Lisboa fazem guerra.
Palavras
Vi trigo vi fome
vi ferros vi feras
vi ruas vi nomes
vi grades vi esperas
vi armas vi muros
vi lutas vi mortes
vi surdos vi mudos
vi fracos vi fortes
vi mares vi terras
vi negros vi servos
vi fardas vi guerras
vi balas vi nervos
vi corpos vi cardos
vi fama vi glória
vi punhos vi cravos
vitória vitória
vi abril vi povo
vi rosto vi espanto
vi nosso vi novo
vi pouco vi tanto
tão cedo tão cedro
tão certo tão perto
tão raiva tão medo
tão mar tão deserto
tão lua tão leve
tão pobre tão pouco
tão fúria tão febre
tão longe tão louco
tão alto tão erva
tão raso tão resto
conversa conserva
tão lento tão lesto
tão urze tão hoje
tão zero tão tojo
tão fica tão foge
tão ontem tão nojo
tão mata tão morra
tão égua tão água
tão pinho tão porra
tão merda tão mágoa