Em seu blog Não lugar, Lina Faria postou uma foto incomum, quase sem perspectiva. Ela informa que se trata de um trabalho “da série de cicatrizes de casas que já se foram, mas mantiveram sua silhueta impregnada na parede do lado. Prova de que a forma supera a utilidade das coisas”.
Roubei a foto de lá (deixando a original, é claro) e pago com um comentário poematizado. Como prometi que faria (sem trocadilho) sobre fotos de Lina.
Fatia do Passado
Cleto de Assis, sobre foto de Lina Faria
A velha casa se foi
transformada em cacos,
talvez em restos de depósito de demolição,
talvez em entulho de construção
talvez em saudade de alguém que lá viveu.
A velha casa partiu
e logo, logo nem restará
a fatia impressa na parede lateral que virou muro
e alguém recolherá as esmolas nela encostadas,
a ex-porta, a ex-janela, a ex-parede de madeira
a centena de tijolos desgastados
e quem sabe os ladrilhos brancos do ex-banheiro.
A ordem e o progresso urbanos retirarão de cena
o quadro mondriânico amarelo-branco-preto
dividido em áurea proporção
onde alguém grafitou um homem deitado
e um (talvez) rabo de galo.
Ainda bem que Lina passou por ali
e seu olho mágico tornou imortais os restos mortais da velha casa.
Obrigada, amigo Cleto, por expressar tamanha sensibilidade em suas palavras.
Obrigada, amigo Cleto, pela sensibilidade que expressou em suas palavras.