Maio é o mês de Paul Garfunkel, querido amigo com quem convivi, na década de 60, nos bons tempos da Escola de Belas Artes e da Galeria Cocaco. O mestre Garfunkel descia quase diariamente a rua XV, nos fins de tarde, desde seu ateliê, nas imediações da Universidade Federal, e se reunia com os jovens artistas da época, numa convivência pacífica e produtiva, em que as faixas etárias eram ignoradas e todos respiravam o pouco de arte da Curitiba de então. Discreto sempre, nunca deixou de comparecer a exposições e eventos culturais, sempre acompanhado da criativa e palpitante Madame Garfunkel.
Nascido em Fontainebleau, a 60 km de Paris, França, em 9 de maio de 1900, ele veio para o Brasil em 1927, um ano após ter casado com Helène Fanny Ginvert, mais conhecida, em sua vida paranaense, como Madame Garfunkel, responsável pela dinamização da Aliança Francesa, uma referência cultural em Curitiba por várias décadas. Em suas primeiras andanças por São Paulo (onde nasceria, em 1929, sua filha Françoise-Marie, a Franchette, omo era carinhosamente chamada por todos) , colocou à disposição sua formação de engenheiro industrial, mas acabou vindo para o Paraná, estado que o captou definitivamente como artista visual. Em meados dos anos 60, editamos, Philomena Gebran e eu, um singelo álbum de reproduções de aquarelas de animais feiotas por Paul Garfunkel, por ocasião de uma daquelas famosas feiras agropecuárias do Parque Canguiri.
Depois, já por conta de minhas caminhadas fora de Curitiba, tive nova aproxcimação com sua obra ao proteger, em Brasília, no ano de 1984, uma coleção de 30 aquarelas em poder de um esperto metido a experto em artes, que ameaçava destruir as obras do artista, só porque suas ofertas de venda do acervo a órgãos públicos e empresários não obtiveram êxito. Coincidentemente, eu ocupava interinamente a presidência do Conselho Nacional de Direito Autoral e, ao notar que a ameaça do vândalo se constituía em crime previsto em lei, decidi tomar providências para evitar a morte anunciada das aquarelas. Mas houve demora na ação preventiva, pois o CNDA teve que requerer uma medida cautelar à Justiça, cuja liminar foi concedida somente duas horas após a realização do happening destrutivo, em um hotel de Brasília. Ainda tentei, por telefone, comunicar-me com o tresloucado “colecionador”, mas ele tinha chamado a atenção da imprensa e não desistiu de seu intento. Sempre espertalhão, ele não destruiu completamente as aquarelas, mas retalhou-as cuidadosamente com uma tesoura, em quatro partes cada uma, por certo prevendo uma possível restauração. Isso facilitou nossa próxima ação, já por meio do Ministério Público Federal, para requerer à Justiça a apreensão e guarda das aquarelas mutiladas, todas encontradas, no dia seguinte, na casa do iconoclasta tupiniquim, para onde me dirigi, em companhia do oficial de justiça, para recolher os despojos.
Como, na época, eu trabalhava no Ministério da Justiça, que tinha instalado recentemente um bem aparelhado laboratório de restauração de livros e documentos, consegui o apoio do estão ministro Ibrahim Abi Ackel para que as obras fossem ali restauradas. O fim da história? Ainda não chegou. Segundo soube recentemente, a ação sobre a apreensão das obras ainda corre na Justiça de Brasília, apesar dos 15 anos decorridos. Coisas do meu Brasil brasileiro.
Mas voltemos a Garfunkel, cuja obra já pertence à história da arte parananese e brasileira. Aliás, sua longa permanência na vida artística do Paraná, desde o pós-impressionismo (onde muitos o situam), à reação ao abstracionismo e a renovação das artes plásticas, depois de 60, o tornou partícipe de vários eventos importantes de nossa cultura.
Como registrei no início, maio é seu mês. Nasceu num 9 de maio (outra coincidência: eu também) e morreu no dia 11 de maio de 1981, exatamente há 18 anos. No livro Paul Garfunkel: um Francês no Brasil, seu genro Karlos Rischbieter conta: “Ele registrava tudo em cadernos, blocos, folhas soltas. Tudo: pessoas, animais, casas, paisagens, tudo o que lhe aparecia à frente. E era um registro de ‘repórter’, no bom e original sentido da palavra. Com traços poucos e leves, uma espécie de sumi-ê ocidental, ele captava o seu assunto como se tivesse o poder de uma máquina fotográfica que, por uma capacidade extraordinária, sé enxergava e reproduzia o essencial.”
A crítica de arte Adalice Araújo escreveu, em 1974: “O que mais nos emociona em sua vasta produção são os croquis e manchas rápidas, em que nos transmite a impressão primeira das coisas. Como os impressionistas, é sobretudo um artista de instantâneos, em cujos toques nervosos de grande vibração mágica, capta a crônica da vida cotidiana…”
Mas é dele a palavra final: “Não entendo por que se criam tantos tabus em relação à arte. Ela é em essencial tão simples! Está nas ruas, na gente que passa; é apenas uma questão de sensibilidade, de transmissão de sentimentos, de diálogo de amor“.
A Paul Garfunkel, nosso abraço saudoso. E nossa homenagem, com o vídeo seguinte, que mostra o seu assíduo comparecimento aos recitais de música, sempre anotando tudo.
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Ilustrações (de Paul Garfunkel)Auto-retrato (1945) Óleo s/ tela 45x31cm Largo da Ordem (1957) Óleo s/ tela demais informações não localizadas
Oi!
Muito legal a matéria! Agradeço em nome de vovô!!! Aproveito pra contar 2 coisas:
– Estamos preparando uma grande exposição Paul Garfunkel que começará em 14 de julho desse ano, lá no MON.
– O vídeozinho dos músicos é de autoria de um grande amigo argentino, Mauricio Runno, escritor que acabou sendo a pessoa que organizou e catalogou milhares de aquarelas do PG, que viviam em pastas que ficaram com a familia.
Na exposição de julho, um dos envolvidos é o Armando Merge, que foi curador voluntário da exposição qe fizemos no Brde de Curitiba no ano passado, qdo pela primeira vez mostramos os sensacionais cadernos de esboço do Paul.
Grande abraço e obrigado!
luca