Cerca de 200 pessoas foram cumprimentar Manoel de Andrade no lançamento do livro Poemas para a Liberdade, na última quarta-feira, dia 15 de abril. Na ocasião, além das palavras de agradecimento do poeta, os convidados ouviram a declamação de seus poemas, pelo próprio autor e pela poetisa Marilda Confortin. Renovamos nossos parabéns ao autor e desejamos uma caminhada de pleno sucesso a sua nova obra.
A indicação é do Google: Ver um Velasquez ou um Rembrandt em um lugar como o Museu do Prado, da Espanha, é uma experiência única. Agora você pode usar a tecnologia do Google Earth para navegar entre as reproduções de obras primas do Prado, penetrando ainda mais profundamente naquela coleção. No Google Earth, você pode se aproximar o suficiente para analisar as pinceladas de um pintor ou o craquelê sobre o verniz de uma pintura. As imagens dessas obras têm resolução de cerca de 14.000 milhões de pixeis, 1.400 vezes mais detalhadas que a imagem de uma câmera digital de 10 megapixeis pode conseguir. Além disso, você será capaz de ver uma espectacular reprodução em 3D do museu. Experimente a arte dentro uma nova maneira. Abra o Google Earth, habilite a camada 3D buildings (Construções em 3D na versão em português) no painel esquerdo inferior; escreva Museu do Prado na caixa equerda superior (Voar para), clique na lupa ao lado, inicie a sua visita e veja em detalhes quase microscópicos as obras de arte selecionadas. Com visão superior à dos que visitam o museu pessoalmente e são obrigados, por questões de segurança, a se manter a uma certa distância dos quadros. Veja uma amostra nos vídeos indicados abaixo (uma dica: clique no botão HQ – high quality, para ver em alta resolução).
O Jornal da Globo de hoje (16/04/09) explicou a novidade.
“Uma manhã de primavera em Madrid e um dos museus mais fascinantes do mundo, aberto só para mim. Bom, não é bem assim. Dia fechado ao público, a imprensa pode entrar e gravar. Mas é uma maravilha poder ver tudo sem gente na frente, sem barulho. Para quem gosta de arte, o Prado é um banquete visual. A gente pode se demorar diante de um quadro como o Jardim das Delícias, de El Bosco, Hieronimus Bosch. Poder ficar observando cada traço, cada toque do pincel. É claro que esse é um privilégio para poucos. Mesmo tendo dinheiro, quantos museus uma pessoa consegue visitar ao longo de uma vida? Mas e se essa experiência, com a riqueza dos detalhes de uma visita ao vivo, estivesse disponível na tela do seu computador?
O passeio virtual, em super alta definição, começa pelas ruas de Madri. Chegando ao Prado, o museu pode ser visto em 3D. Um estudo da arquitetura do palácio, antes de romper porta adentro e ver 14 obras-primas como nunca foram antes vistas. Voltemos ao Jardim das Delícias. O tríptico, cheio de detalhes minúsculos, está afastado do público, questão de segurança. A gente vê as cenas fantásticas de pecados e prazeres que El Bosco criou no começo dos anos 1.500, um surrealismo bem precoce. Mas só no passeio virtual conseguimos ver a expressão do próprio artista, num cantinho da tela, se deliciando com as cenas que criou.
O Prado é o primeiro grande museu a botar suas principais obras em altíssima definição na rede. O trabalho foi encomendado para uma pequena empresa sediada no centro de Madrid. Foi tão inovador, que eles documentaram bem o processo. Uma máquina fotográfica poderosa, fazendo milhares de fotos, muito bem calibradas, de cada pedacinho do quadro. Um imenso quebra-cabeças, depois montado no computador. A base tecnológica foi a mesma usada, por exemplo, para a já célebre foto panorâmica da posse de Barack Obama. Mas tratando-se de obras-primas, foi preciso desenvolver novas ferramentas, e terminar ajustando alguns encaixes manualmente. Foi um pouco de tecnologia e um pouco de artesanato?
“Um pouco de artesanato, sim. Fizemos máquinas especiais, aqui, à mão ali, para pode levar a cabo o projeto. Foi uma combinação de elementos”, diz Fernando Garcia Lerma, chefe do projeto. O resultado é que a gente pode ver detalhes que só especialistas em arte, com acesso a examinar as obras de perto, e com lupa, sabiam que existiam. As Três Graças, de Rubens, a olho nu, pode-se ver, sim, que uma delas tem uma espinha na derriére. Mas e esta abelha, no meio da guirlanda de flores sobre as graças? “Os visitantes do museu e mesmo os entendidos que não podiam pegar uma escada e espiar acima das três graças, não poderiam saber que a abelha existia”, afirma Fernando.
Maravilhas de detalhes. A costura feita por restauradores passando pela face de Velazques no imenso quadro As Meninas. A lágrima ainda se formando nos olhos de João, que apóia Maria, uma mãe que perde os sentidos ao ver o filho morto na cruz.
Roger van der Weyden, "A Descida da Cruz"
Os diferentes estilos, marcados profundamente. Se em um quadro a proximidade espanta pela perfeição, em outro, de perto tudo parece abstrato. Os olhos espantados do homem prestes a ser fuzilado, não mais que uma pincelada negra.
Francisco Goya, "O 3 de maio em Madri"
Desde o início da internet, os museus entenderam o poder dessa ferramenta para divulgar seu acervo, mas este é um novo passo. Viajar pela tela do computador fica cada vez mais real. Se antes você podia procurar um endereço, digamos, em Paris, pela foto de satélite do Google Earth, o Google Street View agora te põe em frente ao prédio, uma espiadinha na janela, ali, no sexto andar.
O programa começou em São Francisco, na Califórnia, e já inclui muitas cidades ao redor do mundo. Não sem controvérsia. Em uma vila inglesa, o carro com a câmera que faz as imagens foi barrado por moradores enraivecidos que veem o programa como quebra da privacidade. Em Londres, as imagens de um rapaz bêbado, vomitando na sarjeta, de um marido saindo de um sex shop, causaram polêmica e processos e foram retiradas do programa. Mas a maioria dos usuários vê o Google Street como um passeio virtual. Como eu vou da Torre Eifell até a Praça da Concorde? Como é o trânsito na área da Notre-Dome de Paris? Onde tem aquele sorvete maravilhoso, no coração da Ille de Saint Louis? É claro que essa experiência não vem acompanhado dos barulhos, os cheiros, os sabores que fazem uma viagem uma experiência tão única. Mas talvez seja só uma questão de tempo.”
Vale a pena fazer a viagem virtual. Uma fantasia dentro da realidade, com detalhes ainda mais realistas. Mais um avanço do milagre internetiano.C. de A.
Erly Welton Ricci nasceu em 1955, em Londrina, PR. Graduado em Psicologia (UFES/ES) e Letras (UEM/PR). Jornalista, atuou em jornais (Folha de São Paulo, Jornal do Brasil, Correio Brasiliense, Folha de Londrina) e revistas (Planeta, Isto É e Em Tempo – como editor). Foi correspondente da Agência Folha na África do Sul, Bósnia e Afeganistão, na década de 80. Desde os 14 anos, dedica-se à poesia, com publicação em diversas revistas e jornais literários, e na produção de documentários sobre cultura e ciência. Tem dois livros publicados: Poeisi Y Auteridade e Imagética In Fine, e dois inéditos, Mitofobia, uma série de cem poemas para serem lidos em voz grave, e Zona Desconhecida (aliteração dos signos). Atualmente trabalha como assessor de comunicação da Prefeitura de Antonina, onde reside desde 2002.
Os haikais que publicamos foram classificados em concurso de poesia do Japão (2007). Compostos originalmente em inglês, dentro dos padrões exigidos pelo concurso com as temáticas próprias dos haikais – referência a uma estação do ano, natureza e com três versos de 5,7 e 5 sílabas. Segundo o autor, foi feita “uma tradução praticamente literal preservando a métrica, mas não soam tão caligráficos como o pretendido originalmente”.
haikais em cinco estações
1.
primavera só
enquanto cor o dia
arco-íris tem flor
xxxxxxxxxxx
xxxxxxxxxxxxxx
2.
minha calma vai
folha que voa livre
no azul céu outonal
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3.
o tempo é sol
presente em só quatro
estações sentimentais
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4.
cobre o mundo
branco sobre o prado
neve de cristal
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5.
beija-flor bebe
doce orvalho branco
fina flor de luz
Hoje, 15 de abril, a partir das 20 horas, no Espaço Cultural Alberto Massuda (Rua Trajano Reis, 453 – Centro Histórico de Curitiba), Manoel de Andrade lança a edição bilingue de seu livro Poemas para a Liberdade.
Publicamos, abaixo, um dos poemas do livro, em suas duas versões. A primeira, no idioma espanhol, como foi publicado originalmente.
Mensaje
Vosotros que aguardáis la vida en el vientre de los siglos,
que sois la gestación de la nueva raza todavía por venir
hoy es para vosotros que yo canto
hoy que vivimos en un tiempo de mártires
granadas floreciendo veloces
mil panteras hambrientas rondando nuestro vientre
puñales azuzados en todos los puños.
Hombres del futuro
es para vosotros mi esperanza mi certeza ardiente
las rosas rojas de mis labios; vosotros que sois las uvas
y el pan de la justicia en nuestros sueños calci¬nados
vosotros que vendréis para justificar nuestra san¬gre
y nuestro dolor.
Va mi verso, va…
porque hoy es triste cantar en las tinieblas
cantar con el hambre de mi pueblo
con el murmullo de los oprimidos;
y con mi hablar hecho de llantos,
hecho de pájaros torturados,
cantar el destino demente de mi patria,
cantar con los cuerpos de los que caen,
y sentir que muero tantas veces
y saber que tantos ya murieron
para que vosotros piséis un día
el suelo de la libertad.
Va velero, va…
mis versos transformados en un solitario barco
a buscaros más allá de muchas lunas.
Me voy de aquí
para no ver mi canción marchitando.
Me voy de aquí
porque el poeta tiene que mendigar por una rosa infinita
por un suburbio qualquiera de la eternidad.
Generaciones futuras,
es para vosotros que hoy canto
para un tiempo de hermanos y camaradas.
Me voy de aquí
a morar con vosotros en la eternidad de la vida.
Va velero, va…
y no encalles la poesía en las aguas bajas de estos años
porque aquí los poetas ya no son oídos.
Navega en busca de los que aún vendrán,
lleva mi sueño por el inmenso mar del tiempo,
llévame bien lejos de mis lágrimas.
Mensagem
Vós que aguardais a vida no ventre dos séculos,
vós que sois a gestação da grande raça ainda por vir,
gerações futuras,
hoje é para vós que eu canto
porque hoje nós vivemos num tempo de mártires
granadas desabrochando velozes
mil panteras famintas rondando nosso ventre
punhais atiçados em todos os punhos.
Homens do futuro
é para vós minha esperança
minha certeza ardente
as rosas rubras dos meus lábios.
Vós que sois as uvas
e o pão da justiça em nossos sonhos calcinados.
Vós que vireis para justificar o nosso sangue
e a nossa dor.
Vai meu verso, vai…
porque hoje é triste demais cantar nas trevas
cantar com os gritos do meu povo
com o murmúrio dos oprimidos…
e com minha fala feita em prantos,
feita de pássaros torturados,
cantar com os corpos dos que tombam,
e sentir que morro tantas vezes
e saber que tantos já morreram
para que vós piseis um dia o chão da liberdade.
Vai veleiro, vai…
meus versos transformados num solitário barco
a vos buscar além de muitas luas.
Vou-me daqui
para não ver minha canção murchando.
Vou-me daqui
porque o poeta tem que mendigar por uma rosa infinita
por um subúrbio qualquer da eternidade.
Gerações futuras
hoje é para vós que eu canto
para um tempo de irmãos e camaradas.
Vou-me daqui
para morar convosco na imortalidade da vida.
Vai veleiro, vai…
e não encalhes a poesia nas águas rasas destes anos
porque aqui os poetas já não são ouvidos.
Navega em busca dos que virão ainda,
leva meu sonho pelo imenso mar do tempo,
leva-me para bem longe das minhas lágrimas.
xxxxxxxxxxxxxxxCuritiba, novembro de 1968______________________Ilustração: montagem de C. de A.
Não usa sapatos novos
Nem assoma na janela
O uivo de sete paredes
Nosso medo
Ruas mal-iluminadas
Pedra assentada no ombro
O que espreita na lida
O nosso medo
Signo de nenhuma estrela
Crucificada no erro
Em vestes corruptíveis
Nosso medo
Fala pelos cotovelos
Entre ossos e lama e aço
Cerra olhos e punhos
Nosso medo
Não tem a morte no rosto
Não oferece a outra face
Ferro e fogo do verso
O nosso medo
Cálice de vinho e veneno
Inverno de mitos sangrentos
Desperta mil vezes em cena
O nosso medo
É uma montanha de pedra
Ciência e deuses no Olimpo
Rosário de cal e areia
Nosso medo
Punhado de sal na têmpora
O dia que ainda não veio
Barco na névoa espessa
Nosso medo
Cova rasa do julgamento
A linha de qual horizonte
Minúcias de cal e areia
Nosso medo
São farpas e ferpas na unha
Estrada longa e estreita
Reza pra todos os santos
O nosso medo
Ferrugem no pó e nos pelos
O sangue de metal e fungos
A certeza de não sabermos
O nosso medo
Em doze motes de cera
Ferro de muros e cercas
Arame em torno do punho
O nosso medo
Erly Welton Ricci
________________________
Ilustração:
A Tempestade (1893), de Edward Munch (1863-1944)
Óleo sobre tela
91,5 x 131 cm
Museu de Arte Moderna, Nova Iorque
Da imensidão da concha
Recrio-me da pequenez
Invado minha floresta
À cata do rio mais limpo
Para garimpar a perola negra
A mais sublime pedra
Gerada pela concha
Que só revela seus segredos
À sua imensa floresta
No interior da floresta
Guardada pelas águas dum rio livre
A concha jamais aborta suas pérolas
Ela recria-se com tanta imensidão
Deixa de ser pequena habitação
Para se tornar palácio de todas as pérolas
E ser o ventre de toda natureza
No movimento mais sublime da criação
Do molusco perfeito que se arrasta pelo chão
Assim é a imensidão da minha concha
Quando se lha tem guardada pela floresta e pelo rio
Não há nada mais sublime; e nem divino
Nada maior existe que sua própria dimensão
Pérola e molusco vagam a mesma floresta
E navegam no mesmo rio de águas livres
Rompendo rochedos; furando pedras
Abrindo caminhos com a força do furacão
Rasgando a imensidão da terra para nova habitação
Pouco a pouco, vamos nos tornando conhecidos. O blogAsamblea de Palabras, editado pelo poeta Francisco Cenamor, publicou uma nota na coluna em que analisa os sites mais destacados.
“Banco da Poesia es un blog que aún tiene poco recorrido pero cuyo objetivo comienza a ser visible en sus entradas: dar a conocer poetas en lengua portuguesa y española y servir de encuentro entre ambas culturas poéticas. Desde luego, un encomiable esfuerzo. Poco a poco va creando también su índice de categorías, lo que será de mucha ayuda a quienes se internen en esta interesante página. Es de agradecer que entre los primeros poetas elegidos para esta colección de poesía hayan incluido a nuestro editor.”
Escolhi a Pêssanka como tema para esta Páscoa por dois motivos. O primeiro é sua integração à cultura do Paraná, por meio dos ucranianos que para cá vieram, a partir de 1895. O outro motivo é a sugestão que ofereço sobre esses aparentemente exóticos desenhos feitos com extrema delicadeza em ovos de galinha. Ou de codornas, gansas e até de avestruzes. Ao examinar variadas pêssankas e aprender sobre a rica simbologia que dá origem a suas formas e cores, penso em cada peça muito além de seu significado artesanal. Sugiro, sem exagero, que estamos diante de uma nova forma de poesia, ou seja, o POEMOVO. Ou, tomando a raiz grega, POEMÔON? Ou com a raiz latina – POEMOVUM? Pois se temos o poegrama, o poetrix, por que não o poemovo?
Pode parecer brincadeira, mas não é. Peguemos a etimologia do vocábulo pêssanka, originado no verbo pessaty, que significa escrever. E a arte da pêssanka consiste não só em pintar um ovo, mas, em primeiro lugar, escrever sobre o ovo uma mensagem promissora. Para isso, são utilizados grafismos variados, cada qual com seu significado, como pode ser visto no quadro abaixo. Cada forma, cada cor, está impregnada de um simbolismo que, por sua vez, quer gerar sentimentos positivos em quem os vê. Mas não são apenas símbolos plásticos. Há uma escrita simbólica usada para dizer algo: isto é poesia.
Aliás, essa tese já foi defendida até em trabalho apresentado em um encontro de pesquisadores de artes plásticas (Analu Steffen, mestre em Arte e Cultura Contemporânea pela UERJ), no qual a autora chama as pêssankas de “ovos escritos ou poemas imagéticos”.
É claro que há ovos simplesmente decorados com figuras geométricas e cores escolhidas ao acaso, apenas para se conseguir uma composição agradável. Mas as legítimas pêssankas são cheias de simbolismo, tal como em um poema, no qual as metáforas abrem os poros da realidade e mostram – ou tentam mostrar – o dentro, o espírito, a essência. Isto é poesia.
O simbolismo começa no objeto utilizado para essa forma de expressão, o ovo. Ele é considerado um símbolo da perfeição, por sua forma geometricamente perfeita, cuja curvatura se estrutura para proteger a cria de fora para dentro e oferecer pouca resistência de dentrro para fora, poupando as forças do nascituro. E mais: a forma do ovo também se encaixa no conceito da Proporção Áurea, ou seja, a relação entre sua altura e sua largura se aproxima do número φ (phi), 1,618 (leia, abaixo, o interessante texto de Rubem Alves sobre o produto avícola). Mesmo que olhemos um ovo com olhos de glutão, imaginando as várias possibilidades gastronômicas que esse saboroso alimento oferece, é preciso, sobretudo, reconhecê-lo como portador de vida nova. Um ovo, portanto, simboliza o princípio de todas as coisas, a criação da vida. Ele está em todas as tradições religiosas, das mais antigas às contemporâneas.
Ao lembrarmos as pêssankas, fazemos uma homenagem à colônia ucraniana que trouxe para o Paraná estas e tantas outras tradições bonitas. Aliás, um belo programa de Páscoa é visitar o Memorial da Ucrânia, erguido no Parque Tinguí, em Curitiba. Lá podem ser vistas peças do artesanato ucraniano e quadros com poemas da paranaense Helena Kolody (1912-2004), filha de imigrantes ucranianos que se conheceram no Brasil.
Pesquisa de Jeroslau Volochtchuk e Waldomiro Romero,Curitiba, 1984
Feliz Páscoa para todos!
E releiam o belo poema de Manoel de Andrade (clique aqui), publicado neste blog, sobre o momento doloroso que, segundo a tradição cristã, antecedeu o domingo da páscoa, naquele início de nossa era.
C. de A.
Reflexões sobre o Ovo
Rubem Alves
Em longo texto escrito para sua netas, o escritor e filósofo Rubem Alves fez as observações seguintes.
“O corpo da galinha sabe muito de geometria. Foi o ovo que me contou. Porque o ovo é um objeto geométrico construído segundo rigorosas relações matemáticas. A galinha nada sabe sobre geometria, na cabeça. Mas o corpo dela sabe. Prova disso é que ela bota esses assombros geométricos.
Sabe muito também sobre anatomia. O ovo não é uma esfera. Ele tem uma parte mais grossa e uma parte mais fina. Há uma razão físico-anatômica para isso. É a mesma razão por que os pregos têm uma ponta fina: para entrar melhor no buraco. Você já enfiou uma linha no buraco de uma agulha? Primeiro é preciso afinar a ponta da linha com saliva e dedo. É a ponta afinada da linha que entra no buraco da agulha. Depois que a ponta fina passa pelo buraco, é fácil puxar a linha, fazendo passar a parte grossa. Pois o ovo tem de ter uma ponta fina para facilitar a sua passagem pelo fiofó da galinha. Se não tivesse a ponta fina ia ser mais difícil, ia doer mais…
O corpo das galinhas é também um grande conhecedor de arquitetura. A forma do ovo dá resistência máxima aos seus frágeis materiais. Se o ovo fosse chato ele se quebraria quando a galinha se deitasse sobre ele, para chocar os pintinhos. Quando eu era pequeno eu e os meus amigos brincávamos de pegar um ovo, ponta fina na palma da mão, ponta grossa contra os dedos pai-de-todos e o seu-vizinho (espero que você tenha aprendido o nome dos dedos, minguinho, seu-vizinho, pai-de-todos, fura-bolo, mata-piolho) e apertar. Pois o ovo não quebrava. Mas não vá fazer essa experiência com esses ovos brancos, de granja. São ovos degenerados. Esses ovos se quebram, só de olhar. A forma do ovo faz com que as forças que sobre ele se exercem não o quebrem. É o mesmo princípio que os arquitetos usam para fazer arcos de janela, de portas e abóbadas gigantescas das catedrais em estilo românico, antes do concreto e do ferro. Se você não sabe o que é o estilo românico, pergunte ao seu professor de história. Aquilo que os arquitetos aprenderam depois de muito pensar, o corpo das galinhas sabe por nascimento, sem precisar pensar.
Mas há ainda um outro assombro: a casca do ovo não pode ser muito mole porque, se fosse, o ovo se quebraria quando a galinha pisasse nele. A casca tem de ser dura o suficiente para suportar o peso da galinha, sem quebrar. Mas a casca também não pode ser muito dura. Como vocês sabem, as galinhas “chocam“ os ovos. Deitam-se sobre eles por 21 dias para, com o seu calor, realizar a transformação da gema em pintinho. Quem foi que ensinou isso para a galinha? Ninguém. O corpo dela nasceu sabendo. A idéia já está lá. Ao cabo de 21 dias os pintinhos estão prontos para sair. Para isso eles têm de quebrar a casca do ovo com o bico. Ora, se a casca do ovo fosse muito dura o pintinho não conseguiria furar a casca e morreria. Como é que a galinha faz esse complicado cálculo físico de resistência de materiais, casca nem muito mole e nem muito dura? Não sei. Só sei que ela sabe. Há um saber no seu corpo que faz cálculos engenhariais exatos.”
Falta só uma semana para o lançamento do livro Poemas para a Liberdade (Poemas para la Libertad) , em edição bilingue, do poeta Manoel de Andrade, sobre o qual já escrevemos neste blog, dias atrás. Anotem em suas agendas. Não dá para perder.
Escrituras Editora
e Espaço Cultural Alberto Massuda
convidam para o lançamento do livro
POEMAS PARA A LIBERDADE
de Manoel de Andrade
4ª feira, 15 de abril de 2009
a partir das 20 horas, no Espaço Cultural Alberto Massuda
Rua Trajano Reis, 453
Centro Histórico – Curitiba – Fone (41)3076-7202
Com quatro edições no exterior, o livro Poemas para la Libertad estreou em junho de 70 na Bolívia. A 2ª edição surgiu em setembro de 70, na Colômbia, e esgotou-se em algumas semanas nas livrarias de Cali e Bogotá. A 3ª edição, publicada em abril de 71, em San Diego , espalhou-se pela Califórnia e pelo sudoeste dos E.U.A., levada pelos estudantes e intelectuais chicanos. Suas primeiras edições panfletárias, lançadas pelas Federações Universitárias de Cuzco e Arequipa, em janeiro de 1970, ficaram conhecidas em todo o meio estudantil do Peru e percorreram a América nas mochilas de dezenas de estudantes latino-americanos.
Nascido em Rio Negrinho, SC, e radicado no Paraná, onde se formou em Direito, Manoel de Andrade deixou o Brasil em março de 69, por razões políticas, quando sua poesia começava a ser conhecida nacionalmente através de jornais e revistas, como a Civilização Brasileira.
Poesia & História
Evidentemente, a publicação de um livro com referências do tempo em foi escrito insere-se também em um contexto histórico importante para o Brasil, que surpreendeu toda uma geração de jovens idealistas que pretendiam novos caminhos para a vida nacional. O próprio poeta reconhece que sua obra não pertence somente ao reino da Poesia, embora se possa sentir, em sua leitura, marcantes frases poéticas de ternura, saudade e amor, em meio a punhos levantados pela ira política que alimentava a alma do jovem caminhante. Talvez Manoel de Andrade não tenha alcançado seu objetivo mais flamante, que era a luta guerrilheira ao lado de outros jovens bolivianos, seus primeiros companheiros de vida no exílio. Mas seu lábaro poético também foi usado nas marchas daquele tempo.
E servirá, por muito mais tempo, como bandeira para apontar a liberdade como valor maior da sociedade humana, contrário à prepotência dos regimes autoritários que não permitem a livre expressão até mesmo na arte. A liberdade de Manoel de Andrade, portanto, se mescla à arte poética e à história de seu país. C. A.