Arquivo do dia: 27 de março de 2009

Está chegando a edição brasileira de Poemas para la Libertad

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Até agora inédito no Brasil, o sucesso editorial de Poemas para a Liberdade, do poeta Manoel de Andrade, foi tão considerável quanto seu alcance político. A obra estreou em 1970, na Bolívia. A 2ª edição, colombiana, esgotou-se em poucas semanas nas livrarias de Cali e Bogotá. A 3a edição, lançada em San Diego, em 1971, espalhou-se pela Califórnia e pelo sudoeste dos EUA, levada pelos estudantes e intelectuais chicanos. Suas primeiras edições panfletárias, lançadas em 1970 em Cuzco e Arequipa, espalharam-se pelo meio estudantil do Peru e percorreram a América nas mochilas de estudantes latino-americanos. Seus poemas foram publicados em jornais, revistas, opúsculos, cartazes e panfletos.

A nova edição de Poemas para a Liberdade, agora bilíngue, será lançada em Curitiba no próximo dia 15 de abril, a partir das 20 horas, no Espaço Cultural Alberto Massuda (Rua Trajano Reis, 453 -Centro Histórico)

O autor, Manoel de Andrade, é catarinense radicado no Paraná, onde se formou em Direito. Deixou o Brasil em março de 1969, perseguido em razão da panfletagem de seu poema Saudação a Che Guevara, em uma época em que sua poesia começava a ser conhecida nacionalmente por meio de jornais e publicações como a Revista Civilização Brasileira. Seu relacionamento com o movimento estudantil da Bolívia lhe custo a expulsão daquele país, em fins de 1969.  Ali havia chegado em setembro para se integrar ao movimento guerrilheiro comandado por Inti Peredo. Foi preso e expulso do Peru e da Colômbia em 1970. Seus Poemas para la Libertad tiveram uma trajetória política e uma aventura literária que dificilmente outro livro tenha tido. Como falam da luta armada e cantam a saga guerrilheira em uma América Latina então controlada por ditaduras militares, cruzaram clandestinamente certas fronteiras, como uma mala com 200 exemplares da edição boliviana, que chegou a Guayaquil por via fluvial, trazida do Peru por contrabandistas equatorianos.

Poemas para a Liberdade consta de vários catálogos da literatura latino-americana e seus poemas foram inluídos em várias antologias, como Poesia Latinoamericana – Antología Bilingue, publicada em 1998 pela Epsilon Editores de México, em que o autor partilha suas páginas com consagrados poetas, como Mario Benedetti, Juan Gelman e Jaime Sabines.

A capa do livro da nova edição foi inspirada em cartaz de um recital do autor em 1970, na Universidad de Los Andes, Bogotá, Colômbia.

Sobre o autor

Manoel de Andrade nasceu em 1940, em Rio Negrinho, SC. Graduado em Direito no Paraná, começa a publicar seus versos na imprensa curitibana em 1962. Em 1965, recebe o 1º prêmio no Concurso de Poesia Moderna promovido pelo Centro de Letras do Paraná. Ainda em 1965, participa da Noite da Poesia Paranaense, no Teatro Guaíra. Em 1966, a Revista Forma publica seu premiado Poema Brabo. Em 1968, sua Canção para os homens sem face é publicada pela Revista Civilização Brasileira e, ainda naquele ano, junto com Dalton Trevisan e Jamil Snege, é apontado pela imprensa local, como um dos três destaques literários no Paraná. Na época, foi chamado de “poeta maior” pelo jornalista Aroldo Murá Haygert e, posteriormente, destacado pelo crítico Wilson Martins pela sua “grande poesia”. Manoel de Andrade fugiu do Brasil em março de 1969, pela repercussão da panfletagem de seus poemas políticos. Atravessou 15 países da América publicando livros,promovendo debates, dando palestras e declamando seus versos em teatros, universidades e sindicatos. Seu primeiro livro, Poemas para la Libertad é publicado em junho de 1970 na Bolívia e, em janeiro de 1971, Canción de amor a América y otros poemas é editado na Nicarágua e em El Salvador. Em fevereiro daquele ano, Francisco Julião, exilado no México, abre seu primeiro recital de poesia na capital mexicana e, em seguida participa, em Tampico, das comemorações do 37º aniversário de morte de Augusto Cesar Sandino. Em março, viaja à Califórnia, para palestras e recitais nas universidades de San Diego, Los Angeles, Berkeley e São Francisco. Em agosto é convidado pela Universidade Central do Equador a apresentar um ciclo de palestras sobre problemas centro-americanos. Em 1972 retorna anonimamente ao Brasil.

Afastado 30 anos da literatura, participa, em 2002, da coletânea paranaense Próximas Palavras. Volta a publicar em 2007, com o lançamento de seu livro Cantares, publicado pela Escrituras Editora, também responsável pela edição brasileira de Poemas para a Liberdade.

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Retrato do poeta quando jovem, de 1964, obra do artista Juarez Machado
41x61cm – nanquim e guache sobre papel

Poema inédito de João Batista do Lago

Palavra

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Coisa estranha este fenômeno: Palavra!
Nela tudo se decompõe
Numa razão assimétrica
Incoerente e disfuncional
Para no ato seguinte
Ser toda ela funcional
De toda metafísica que se impõe

Não conheço qualquer ser
Que dela não dependa
Nada se lhe escapa
– seja na vida;
seja na morte

Tudo dela depende:
Paz e guerra
Homem e mulher
Criança e adulto
Fome e fartura
Miséria e riqueza
Leis e anomia
Patrão e empregado
Trabalho e desemprego
Céu e terra
Deus e diabo…

Não há na vida
Nem na morte
Sujeito de tamanha grandeza
Dela tem-se toda verdade
Mas a mentira nela invade

Ó, a Palavra!
Reina de todos Poetas
Dela fazem uso os Filósofos
A ela se quedam os cientistas
Diante dela ajoelham religiosos
Na retórica é brinquedo de sofistas

Santa e demoníaca é a Palavra!
Desperta amor e ódio
Fere a alma e o espírito como faca de dois gumes
Rasga a carne do verbo
Dilacera corações de amantes (e)
Beija as mãos que apedreja

Palavra! Ó tu, meiga e doce Palavra!
Rude e azeda como o fel da ponta da lança
Voraz, caidiça, decrépita e senil
Bela, altiva, nobre e digna
Arrogante, soberba e presunçosa
Sou-te o mais humilde escravo na floresta do discurso

Nada – desde a poeira do nada – define-te. Nada!
Explicar-te é todo o mistério
Entender-te é tudo que se deseja
És toda possibilidade do Ser – deus ou diabo –
Habitas no sonho, na realidade e no real
Constróis e desconstróis paraísos e infernos

És o símbolo oculto da mandala
De Parmênides a Sócrates
De Platão a Aristóteles
Sânscrita, ó Palavra, tu és
És mestre do hinduismo e do budismo e do tantrismo
És, enfim, a Paidéia de tudo ser

Francisco Cenamor, poeta de Leganés

Conheci Francisco Cenamor em uma visita ao Palavras, todas palavras, dias atrás. Vidal publicou um poema do poeta espanhol e eu, logo em seguida a leitura, deixei um elogio ao poema e ao poeta. No dia seguinte, ao retornar ao Palavras…, notei que havia outro registro no post do poema. Curioso, fui ler o que pensava ser comentário de outro leitor e, para minha surpresa, era o próprio poeta a agradecer minha leitura.

Como a assinatura estava lincada,viajei instantaneamente até a Espanha e me deparei com um blog literário, mantido por Cenamor, com farto conteúdo. Conheci seu perfil de trabalho, sua intensa atividade de blogueiro poético e a imensa rede de enlaces que já possui. Lá estão vários de seus livros em versão eletrônica, que incluem poemos, contos e peças teatrais.

Outro impulso e enviei um e-mail ao poeta, identificando-me e pedindo permissão para publicar seu trabalho no Banco da Poesia. Sua atenção foi imediata. Poucas horas mais tarde, chegava sua resposta, na qual não só permitia a publicação de qualquer poema seu (“puedes usar para tu blog cuantos poemas quieras. En eso no hay problema, al contrario” ), mas também dizendo estar abeerto a um intercâmbio com este nascente blog brasileiro (“será un honor colaborar en un acercamiento entre estos dos idiomas nuestros, tan bellos para la poesía).

Portanto, comecemos com alguns dados biográficos do poeta, traduzidos de seu blog Asamblea de Palabras (Assembléia de Palavrashttp://franciscocenamor.blogspot.com).

Biografia

franciscocenamorfotografic2a6c3bcapriscillalumbrerasmaquillajealejandracantero09Francisco Cenamor gosta de dizer que nasceu em Leganés (região metroplitana de Madri), em 1965. A parteira disse a sua mãe que, pelo umbigo do bebê, podia dizer que seu filho ia ser artista. Curioso, porém certo. Filho de pais que possuíam um pequeno negócio familiar, destacou-se no colégio até os 14 anos, quando decidiu abandonar os estudos e trabalhar no negócio da família: um açougue de carne de cavalo no bairro madrileno de Vallekas.

Desde menino se dedicou ao teatro e à literatura. Mas continou trabalhando em açougues até os 17 anos. Depois trabalhou em mil atividades, inclusive recolhendo papel e ferro velho. Seu feito mais destacado, nesses anos, além de pertencer desde muito jovem a numerosas associações juvenis e sociais, foi ter se tornado a Quarta Dama de Honra nas festas patronais de Leganés em 1984, notícia que deu a volta ao mundo e obrigou a mudar as normas de participação nos concursos de misses. (Leia a notícia aqui) Também ganhou, no período, algum prêmio literário.

Por fim, em um dia de…, não recordo o ano, passou a trabalhar na revista de atualidades sociais e culturais Página abierta, onde depurou sua técnica literária e adquiriu prática na condensação de textos. Seis anos mais tarde foi admitido como auxiliar de biblioteca na Real Academia Espanhola. Em sua biblioteca descobre milhares de obras em verso e prosa em castelhano, que devora com avidez. Também nessa época entra en contato com um grupo de poetas pela primeira vez, no qual se encontravam alguns jovens que, mais tarde, dariam o que falar no mundo literário.

Em novembro de 2004 abandona a Real Academia para viver da interpretação e de outros trabalhos, inclusive como professor de teatro. Aparece, então, em capítulos de conhecidas séries de televisão, anúncios publicitários e diversos filmes espanhóis.

Atualmente edita o blog literário Asamblea de Palabras e coordena o Clube de Leitura da Universidade Carlos III.

Participa nos Encontros Literários em instituições de ensino superior da Direção Geral do Livro, dentro do Plano de Fomento da Leitura.

Seus libros publicados são:

Amando nubes. Talasa Ediciones, Madri, 1999.
Ángeles sin cielo. Ediciones Vitruvio, Madri, 2003.
Asamblea de palabras. Ediciones Vitruvio, Madri, 2007.

Aparece nas antologias:

Poemas contra la guerra. Edições Vitruvio, Madri, 2003.
Salida de emergencia. Nosomoscómodos Producciones, Madri, 2004.
Pázsalo. Multitud en rebelión. Editorial Fundamentos e Plataforma Cultura Contra la Guerra, Madri, 2004.
Vida de perros. Poemas perrunos. Editorial Buscarini e Ediciones del 4 de agosto, Logroño, 2007.
Bukowski Club 06-08. Jam session de poesia. Ediciones Escalera, Segovia, 2008.
Rósea. Ediciones Bohodón, Madri, 2008.
La mujer rota. Literalia Ediciones, Guadalajara, México, 2008.
Fuga de nada. Ediciones Bohodón, Madri, 2009,

Três Poemas de Francisco Cenamor

cansancio ajeno


hay cada mañana una mujer maría
que se sienta al borde del abismo de su cama
mira hacia abajo antes de saltar
y duda sin remedio de si irá al trabajo

hay cada tarde un hombre manuel
que se sienta cansado en un banco del gimnasio
mira su peluda barriga que no baja
y piensa en sacar mañana todo su dinero e irse

hay también cada mañana un joven raúl
que coge sus libros para ir al instituto
mira con ojos dormidos el desorden de su mesa
y encuentra el cedé que le gustaría quedarse a escuchar

hay cada atardecer una abuela cipriana
que abandona con paso cansado el cementerio
mira con envidia la tumba del marido
y siente que pronto se liberará de su pesado cuerpo

hay cansancio en estos días extraños
y aunque me levanto de la mesa y lo dejo
me dan ganas de escribir al final del poema
que tal vez sean mis ojos los que se han cansado

maldita espiral infinita

unaespiralinfinita rodea mi cabeza
unaespiraldeespirales cuyos trazos
son a la postre mis barrotes
y yo ahora siento que necesito
bajar por un hilo de seda
mecido por una blanca brisa
estar tumbado en una dulce sauna eterna
que en mi sudor se vayan los días trabajados
y que un espejo refleje los ojos que vi esta mañana

niños y niñas

estás y ya no estás
dicen que hay muchos niños
que mueren de hambre cada día
estás y ya no estás

y otros niños nacen cada mañana
como las nubes que no sabes donde
qué tierras mojarán

a veces hay nubes que están
en el cielo mucho tiempo
y un día ya no están
como los niños que a veces ya no están

pero el agua que dejaron las nubes
pueblan cada tierra de raíces
como los niños muertos